Há 15 anos, ‘Cidade de Deus’ concorria em quatro categorias no Oscar

Wilson Spiler

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1 de março de 2019

Considerada uma das maiores obras do cinema brasileiro, Cidade de Deus” obteve um feito inédito para as produções nacionais há exatos 15 anos: foi indicado em quatro categorias para o Oscar de 2004. O longa de dois anos antes concorreu nas categorias Melhor Diretor (Fernando Meirelles), Melhor Roteiro Adaptado (Bráulio Mantovani), Melhor Edição (Daniel Rezende) e Melhor Fotografia (César Charlone).

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Você deve estar se perguntando: “quatro lembranças para um filme brasileiro… onde está a indicação para Melhor Filme Estrangeiro?”

Essa talvez seja a maior decepção daquele ano, visto que era “barbada” a conquista da película brasileira. Não pela qualidade dos concorrentes, que era muito boa por sinal (As Invasões Bárbaras / Canadá; Evil – Raízes do Mal / Suécia; O Samurai do Entardecer / Japão; Irmãs Gêmeas / Países Baixos; Želary / República Checa), mas porque um filme com tantas indicações em outras categorias é considerado carta certa para ganhar a principal em que ele concorre. Um exemplo bem visível – e recente – disso, aconteceu este ano, com “Roma”, que levou três prêmios, inclusive de Melhor Filme Estrangeiro.

Foto: Miramax / Divulgação

A justificativa, no entanto, é plausível. Cidade de Deus” é um filme de 2002 e não conseguiu nomeação ao Oscar no ano em que foi lançado, pois não tinha entrado em circuito internacional, sendo lançado na Europa e Estados Unidos apenas em janeiro de 2003. Com isso, a produção não conseguiu atender à regra estabelecida pela Academia de Artes Cinematográficas. Bruno Wainer, executivo da distribuidora Lumière, inclusive, lamentou que a não nomeação do longa no mesmo ano. Para ele, se a produção de Fernando Meirelles fosse indicada naquele momento, ela superaria a marca de quatro milhões de espectadores (foram, ao todo, 3,37 milhões).

Cidade de Deus” ainda obteve um sucesso estrondoso de crítica, tanto nacional quanto internacionalmente. O longa aparece em diversas relações de jornais e sites estrangeiros como um dos melhores filmes de todos os tempos. Em 2016, a BBC norte-americana colocou a produção brasileira em 38º lugar na lista das 100 melhores obras dos século XXI. O mesmo site elegeu ainda os 100 melhores filmes estrangeiros de todos os tempos e adivinhe quem estava lá? Sim, a produção aparece honrosamente na 42ª posição, à frente de nomes como O Anjo Exterminador (Luis Buñuel, 1962), Amor (Michael Haneke, 2012), Ikiru (Akira Kurosawa, 1952), La Strada (Federico Fellini, 1954)  e Cenas de um Casamento (Ingmar Bergman, 1973).

Foto: Miramax / Divulgação

O britânico The Guardian, por sua vez, deixou a película brasileira na 6ª posição dos 25 melhores filmes de ação de todos os tempos, atrás apenas de clássicos como Apocalypse Now (1979), Intriga Internacional (1959), Era Uma Vez no Oeste (1968)Meu Ódio Será Sua Herança (1969) e Amargo Pesadelo (1972). Além disso, “Cidade de Deus” ainda é muito bem avaliado em páginas que permitem que os usuários deem notas. No IMDb, o longa é o 21º colocado entre os votantes, com uma média excepcional de 8.6 após mais de 600 mil votos. Já no Rotten Tomatoes, que agrega críticas profissionais e reação do público, os percentuais são de 91% e 97% de aprovação, respectivamente. Ou seja, um sucesso total.

No Brasil, o filme também foi bastante reconhecido pela crítica especializada, tendo sido premiado seis vezes no Grande Prêmio do Cinema Brasileiro (o “nosso Oscar”) como Melhor Filme, Melhor Diretor, Melhor Roteiro Adaptado, Melhor Fotografia, Melhor Som e Melhor Montagem. “Cidade de Deus” é também o oitavo melhor filme nacional de todos os tempos, segundo a Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema).

Foto: Miramax / Divulgação

Apesar do estrondoso sucesso, espantosamente, o filme, por pouco, não saiu do papel. O diretor Fernando Meirelles revelou, em 2012, durante um debate no Cine Ceará, que precisou pagar do próprio bolso para rodar “Cidade de Deus” e que o longa ainda não “se pagou”. De acordo com o cineasta, contratos ruins e a falta de investidores deixaram a situação difícil.

“Na hora que o filme estava pronto, eu quis recuperar o que investi e não tinha nenhuma experiência, nem um advogado muito bom. Fiz contratos muito ruins com as distribuidoras. O fato é que pela contabilidade da Miramax, apesar deles terem pago US$ 1,8 milhão pelo filme, e ele ter feito US$ 7 milhões nos Estados Unidos, ainda estou devendo US$ 4 milhões e poucos mil para zerar a conta e começar a receber. Eu vou lá na loja, o filme está nas prateleiras, mas eu ainda estou com um débito” –  afirmou Meirelles, de acordo com o Portal IG.

O longa, no entanto, foi bem de bilheteria, fazendo, ao todo, US$ 30.641.770, sendo US$ 7.564.459 nos Estados Unidos e US$ 23.077.311 no exterior, incluindo aí o Brasil, que gerou uma renda bruta de US$ 10.300.000 para a produção.

A verdade é que, mesmo não tendo vencido em nenhuma das categorias, “Cidade de Deus” fez bonito no Oscar de 2004 e nenhum filme brasileiro sequer chegou perto de repetir o feito. A última indicação tupiniquim no maior prêmio do cinema mundial foi a excepcional animação O Menino e O Mundo, em 2016, que dificilmente ganharia, já que concorria com pesos-pesados como Divertida Mente (o vencedor da noite) e As Memórias de Marnie, produção japonesa do histórico Studio Ghibli. O que o longa de Fernando Meirelles fez em 29 de fevereiro daquele ano dificilmente vai se repetir novamente, em uma performance para se para aplaudir de pé, como os verdadeiros espetáculos exigem.

https://www.youtube.com/watch?v=tDt1O9MIA3M

Wilson Spiler

Will, para os íntimos, é jornalista, fotógrafo (ou ao menos pensa que é) e brinca na seara do marketing. Diz que toca guitarra, mas sabe mesmo é levar um Legião Urbana no violão. Gosta de filmes “cult”, mas não dispensa um bom blockbuster de super-heróis. Finge que não é nerd.. só finge… Resumindo: um charlatão.
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