Cinema ao Pé da Letra – Parte 11: O Poder do Fora de Campo
Pedro Lauria
Hoje vamos dar continuidade a última coluna, sobre a noção de quadro e campo.
E pra começar, vou provar, em apenas uma imagem, o poder do enquadramento.
O enquadramento é uma ferramenta ligada diretamente a noção de mostrar/omitir informações. E este é um dos maiores poderes que um diretor tem a sua disposição. Afinal, o próprio conceito de suspense se baseia nesse dispositivo.
Suspense
Falando sobre suspense, Hitchcock (o mestre desse gênero), em entrevista para Truffaut (crítico e cineasta da nouvelle vague francesa) sintetizou através de um exemplo, a diferença entre suspense e surpresa.
“Imagine um jantar em um pomposo restaurante. Os convidados comem, bebem, arrumam picuinhas e discutem sobre a vida dos outros. Fica claro que existe uma aura de não preocupação ali, apesar dos comentários venenosos que volta e meio são disparados. Boom. Uma bomba explode. Todos que ali estavam presentes, agora estão mortos.”
Ao omitir a informação de que existe uma bomba nas proximidades o diretor consegue gerar um sentimento de surpresa no espectador. Entretanto, se no começo daquela cena o diretor optasse por mostrar que existia uma bomba embaixo da mesa, aquela cena despreocupada passaria a ser extremamente tensa.
A omissão de informações nos filmes de terror
Exemplos práticos de como a omissão/revelação de informações, através de enquadramentos, estão em todo o lugar. Vejamos os filmes de terror.
Exemplos de omissão estão em filmes como Bebê de Rosemary (SPOILER: Onde ao não revelar o bebê, Polanski imortaliza o filme na história do cinema) e Bruxa de Blair. Se pensar em contrapartes de terror, filmes como Cloverfield falham justamente ao mostrar a criatura. Isso se deve a um princípio simples (e como não podia deixar de ser, biológico): tememos tudo aquilo que não vemos/não conhecemos.
Por tal motivo os contos de Cthulhu, de H.P.Lovecraft, são de difícil adaptação para a mídia audiovisual, uma vez que os monstros descritos na obra nunca terão o mesmo impacto ao ser trazido para as telonas. E pior: dificilmente um estúdio aceitaria fazer filmes de monstro, sem revelar o próprio.
O grande público não entenderia.
O público em geral acredita que se ele paga por uma mídia audiovisual, ele tem o direito a ver tudo aquilo que está envolvido na história. No entanto, o que há de se compreender é que o fora de campo apesar de constituir em “material não filmado”, tem a mesma importância narrativa e emocional do que aquilo que está sendo mostrado. Um diretor não deixa de mostrar determinadas informações por ser preguiçoso ou por querer economizar.
E por não entender isso é que somos obrigados a ver Mel Gibson jogar pela janela todo o suspense criado em Sinais, no seu final catastrófico.
Esse filme me deprime tanto, que eu vou parar por aqui. Mas o assunto ainda não acabou.
Até semana que vem.
(E boas manifestações*.)
*Cuidado com a manipulação de enquadramento 😉