CRÍTICA | ‘A Qualquer Custo’ é a melhor obra de western em anos

Bruno Giacobbo

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23 de dezembro de 2016

Até 1992, o western parecia morto para Hollywood. O gênero que consagrara diretores como John Ford, Howard Hawks, Anthony Mann, Sam Peckinpah e o italiano Sérgio Leone, já não era mais tão popular e lucrativo. Contudo, foi neste ano que Clint Eastwood, um ex-astro deste tipo de película, lançou “Os Imperdoáveis”, uma obra-prima que arrebatou, entre outros prêmios, o Oscar de melhor filme. De lá para cá, outros longas foram produzidos, alguns marcantes como “Django Livre” (2012) e “Os Oito Odiados” (2015), ambos de Quentin Tarantino, porém, nenhum sem a mesma consagração na hora de disputar a maior premiação do cinema mundial. Sucesso mesmo fez, ao também levar a principal estatueta da Academia, em 2008, “Onde Os Francos Não Tem Vez”, dirigido e roteirizado pelos irmãos Joel e Ethan Coen, classificado como um misto de drama e thriller, mas que pode, perfeitamente, ser considerado o principal exemplar de um subgênero cinematográfico recente: o neo-western. E se vocês adoraram o longa-metragem dos Coen, atenção, então, para A Qualquer Custo (Hell or High Water), uma vez que esta é a melhor obra deste naipe em anos.

Considerado o melhor filme do ano de 2016, pela Associação de Críticos de San Diego, o longa, dirigido por David MacKenzie, tem como protagonistas os irmãos Toby (Chris Pine) e Tanner Howard (Ben Foster) e mostra uma série de assaltos a agências bancárias, realizados por eles, em uma questão de pouquíssimos dias. O primeiro personagem é um pai divorciado de dois filhos que nunca se envolveu em nenhum tipo de crime. O segundo é um ex-presidiário, solto recentemente após cumprir uma pena de dez anos. Os motivos que os levarão a perpetrar tais roubos não são, incialmente, claros, mas serão esclarecidos depois e isto é parte do charme da trama. Entre um banco e outro, a dupla cruzará o caminho de Marcus Hamilton (Jeff Bridges), um Texas Ranger prestes a se aposentar, e de seu parceiro Alberto Parker (Gil Birmingham). Este  explosivo encontro entre criminosos e policiais estaduais resultará em uma violenta perseguição, que deixará um rastro de sangue e vítimas pelas planícies e estradas texanas.

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Mesmo sendo sangrento e com cenas em que os tiros descambam em mortes, o público não deve se dirigir ao cinema esperando um longa-metragem convencional, dentro do que se imagina para o gênero, ou melhor, para o subgênero. Existe uma alternância grande entre estes momentos e outros de contemplação da paisagem árida e quente do Texas e isto, sob hipótese alguma, prejudica o ritmo da história ou atenua a dose de violência. De certa forma, a impressão, vendo o filme, é que o calor abrasante da região influencia diretamente os humores e comportamentos dos personagens. Sentado na sala de projeção, notei uma nítida semelhança com “Salvo: Uma História de Amor e Máfia” (2013), uma espécie de neo-gângster, rapidamente exibido, aqui no Brasil, dois anos atrás. Nesta ótima película italiana, igualmente contemplativa em diversas passagens, o calor que faz na Sicília e no sul da Itália provoca o mesmo efeito nos seus protagonistas. Há semelhanças, também, com a primeira temporada de “True Detective” (2014). Tanto na série, como no filme, a paisagem (pântanos úmidos ou planícies áridas) se impõe como um elemento fundamental nos desdobramentos das tramas.

Com um plano-sequência giratório logo no início, a câmera faz um rodopio de pouco mais de 180º, A Qualquer Custo revela-se, de cara, um filme muito bem dirigido e com um texto repleto de diálogos inteligentes e mordazes, o que faz dele uma aposta bastante confiável em relação a uma indicação ao Oscar de melhor roteiro original. O script, assinado por Taylor Sheridan, o mesmo roteirista do igualmente bem escrito “Sicario: Terra de Ninguém” (2015), entrega suas melhores falas aos atores Jeff Bridges e Ben Foster, o que acaba valorizando o trabalho destes dois, embora Chris Pine esteja ótimo em cena. Para quem não curte humor politicamente incorreto, um aviso: o ranger Marcus Hamilton brinca o tempo todo com o fato do seu parceiro ser mestiço, meio índio, meio mexicano. Um dos diálogos da dupla, quando Alberto Parker diz que o policial veterano também tem sangue indígena, remete a uma fala de Dennis Hopper para Christopher Walken, em “Amor à Queima-Roupa” (1993), dizendo que o personagem deste, um siciliano nato, tem sangue de mouro. Provocações que revelam a inimizade histórica entre texanos e mexicanos; sicilianos e mouros. Assim, saí do cinema convicto de que vi, em 2016, um dos melhores longas de 2017.

Desliguem seus celulares e excelente diversão.

TRAILER:

FICHA TÉCNICA:

Título original: Hell or High Water
Direção: David Mackenzie
Roteiro: Taylor Sheridan
Elenco: Chris Pine, Ben Foster, Jeff Bridges
Distribuição: California Filmes
Data de estreia: qui, 02/02/17
País: Estados Unidos
Gênero: drama
Ano de produção: 2015
Duração: 102 minutos
Classificação: a definir

Bruno Giacobbo

Um dos últimos românticos, vivo à procura de um lugar chamado Notting Hill, mas começo a desconfiar que ele só existe mesmo nos filmes e na imaginação dos grandes roteiristas. Acredito que o cinema brasileiro é o melhor do mundo e defendo que a Boca do Lixo foi a nossa Nova Hollywood. Apesar das agruras da vida, sou feliz como um italiano quando sabe que terá amor e vinho.
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