CRÍTICA #1 | ‘Blade Runner 2049’ respeita profundamente a obra original e vai agradar bastante aos fãs

Claudio Dorigatti

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4 de outubro de 2017

Antes de qualquer outro comentário, é bom ressaltar que o subtítulo do primeiro filme (lançado em 1982) é um tanto infeliz e incoerente, “Blade Runner – O Caçador de Androides”. Afinal de contas, já na introdução, os referidos “Androides” do subtítulo são denominados de Replicantes, pois apesar de terem sido “fabricados” por humanos em uma indústria (Indústrias Tyrell), eles não são máquinas, possuem circuitos eletrônicos e tampouco são parte máquina e parte orgânicos. Os replicantes são descritos como seres orgânicos fabricados idênticos aos humanos, melhorados geneticamente para serem mais fortes e inteligentes, no intuito de serem escravizados, são quase clones.

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O primeiro filme se passa em 2019 com nosso planeta em estado caótico, pré-apocalíptico. A vida urbana está degradada e com alguns humanos se aventurando em colonizar outros planetas. Os Replicantes, após uma revolta, não podem mais habitar a Terra. Todo Replicante no planeta é caçado e “aposentado”, termo usado para a morte desses seres que não considerados sintéticos e sem vida. A caça é realizada por agentes especiais com aval da polícia e das Indústrias Tyrell. No desenrolar da trama, o caçador considerado o mais hábil percebe aos poucos que há algo maior por trás dos Replicantes, uma evolução não só da engenharia genética, mas natural também. Seu objetivo pessoal deixa de ser o extermínio de qualquer Replicante, embora ele elimine todos os que constam em sua missão. No entanto, agora ele se vê na posição de defender uma nova espécie e o faz no fim do longa original, desaparecendo com um Replicante evoluído para não ser caçado pelos colegas.

E é esse o gancho que nos leva ao segundo filme, Blade Runner 2049. Em uma continuação direta na história 30 anos após, o novo filme traz todo o clima do seu predecessor, com sons, luzes, carros, ambientes, locações e trilha sonora muito semelhantes, além dos atores originais participando de uma forma ou de outra da trama. O tempo de 30 anos para continuações cinematográficas, curiosamente, é muito usado. Será cabalístico, número de sorte? Brincadeiras à parte, em geral, é dado pelo espaço de tempo de uma geração se tornar adulta e renovar o protagonista.

O novo filme é lento, aliás, para quem tem déficit de atenção e gosta de explosões a cada 10 segundos (não é o meu caso, ainda bem), é muito muito MUITO lento. É lento até para contar uma história devagar. Contudo, isso não é um ponto negativo necessariamente. O primeiro longa também é muito lento, até para a época em que foi produzido, e esse clima e velocidade dos acontecimentos foram mantidos. Portanto é um prato cheio pra quem é fã da produção de 1982.

A civilização agora é pós-apocalíptica e está em um colapso ainda maior. A vida humana no planeta em sua maioria está em um submundo pior. Não temos mais animais (somente clones), tampouco florestas ou árvores. Os ambientes foram fortemente inspirados no primeiro filme, desde os mais degradados, até as salas das indústrias Tyrell, com muita criatividade no abstrato nas formas. Da mesma forma, todas as locações, em geral computação gráfica, remetem muito à obra original. Outro cuidado percebido foi quanto aos carros voadores, que no antecessor chamaram muito atenção por ser quase uma primazia no cinema (pelo menos daquela forma tão realística), e que aqui o diretor optou por mantê-los muito parecidos, tanto nas formas, quanto no voo. Ficou evidente a intenção da referência em detrimento de um futuro com mais tecnologia de telas e inteligência artificial como seria (talvez) mais provável. Mais referências também nas luzes, sejam do dia ou qualquer outra fonte de energia, holofotes e hologramas lembram muito a película predecessora.

Na mesma linha, segue a trilha sonora, uma mistura de sons eletrônicos de sintetizadores (uma certa novidade em 1982) que foi mantida com samples mais “abstratos” de timbres fortes não facilmente identificáveis, mas que remetem a uma mistura de máquinas, computadores, indústria e invariavelmente a algo sombrio. Interessante, mas na medida errada, é a mixagem dos efeitos sonoros. Os sons das naves e dos carros são um pouco diferente do que estamos acostumados. Ainda mais interessantes são os samples de instrumentos no meio de cenas e trilhas, sons em geral mais graves e alguns agudos. São “causadores de impacto” para contribuir com as cenas e o clima do filme e o fazem bem, exceto pelo volume. A impressão é de que alguém esqueceu o canal de áudio muito alto na masterização. É tão alto que chega a incomodar. Uma pena porque é uma trilha abstrata, diferente do habitual e muito inspirada no longa original.

Ainda no “segmento” continuação, temos de volta à cena, além de Harrison Ford no papel de agente caçador Rick Deckard, outros atores da obra de 1982 também em seus papéis, mas dizer mais sobre isso é spoiler dos grandes.

Resumindo, Blade Runner 2049 é um dois poucos casos no cinema em que uma obra é continuada respeitando a original. Boa parte dessa conquista, obviamente, é devido à presença de Ridley Scott como produtor (diretor em 1982) e Hampton Fancher como roteirista em ambas as produções. Denis Villeneuve, diretor da produção atual, provou ser capaz de mergulhar em uma obra, respeitar, adaptar à nova realidade e a expandir corretamente.

Para quem não é fã do primeiro filme, essa continuação pode ser cansativa, seja pela velocidade em que tudo acontece ou pelo tempo de projeção que é longo, além de também ter uma trama mais complexa do que o habitual hoje em dia. Já entre os fãs, dificilmente alguém poderá reclamar. Há uma boa continuidade na história e todo o clima sombrio e decadente do mundo de Blade Runner é transportado para o novo, inclusive a chuva. Ah, a chuva, é o mesmo dilúvio que não para, parece não dar trégua há 30 anos!

::: TRAILER

::: FOTOS

::: FICHA TÉCNICA

Direção: Denis Villeneuve
Elenco: Harrison Ford, Ryan Gosling, Carla Juri, Jared Leto
Distribuição: Sony
Data de estreia: qui, 05/10/17
País: Estados Unidos
Gênero: ficção científica
Ano de produção: 2016
Duração: 163 minutos
Classificação: 14 anos

Claudio Dorigatti

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