Crítica de Filme | Ausência

Colaboração

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24 de novembro de 2015

Texto de Camila Vieira

Apesar do título, Ausência (2014) é um filme profundamente interessado em presenças: quer dizer, no modo como os personagens se relacionam com o mundo e de que maneira seus rostos expressam concretamente tais relações, servindo-se de uma abordagem bastante naturalista. Isto já era um procedimento caro ao diretor Chico Teixeira desde A Casa de Alice (2007), seu longa-metragem de estreia na ficção, que trata do cotidiano de uma manicure (interpretada por Carla Ribas), sua relação com a mãe idosa, o marido infiel e os três filhos problemáticos. Este interesse particular em torno do subúrbio de São Paulo é, de alguma forma, resgatado sete anos depois em Ausência.

No entanto, o olhar agora é para o adolescente Serginho (Matheus Fagundes), que desde cedo precisou assumir a responsabilidade sobre sua própria vida, após o abandono do pai – o filme inclusive inicia com a figura paterna retirando objetos da casa, deixando a família com poucos bens, em um apartamento simples em Santo Amaro. O jovem trabalha com o tio em uma feira, cuida do irmão caçula e ajuda a mãe alcóolatra (Gilda Nomacce), que vende bolos para sobreviver. Serginho tem amigos de sua idade, como os garotos da feira, mas gosta de passar parte do seu tempo livre na casa do amigo professor Ney (Irandhir Santos).

519-by-Mujica-e1411505057150O que é louvável na dramaturgia de Ausência – que teve a consultoria de nomes importantes, como o critico e ator Jean-Claude Bernardet e os cineastas Marcelo Gomes e Caetano Gotardo – é que, apesar das dificuldades pelas quais os personagens passam, não existe a vitimização do protagonista, tampouco uma queda no submundo. Em vez de se lamentar o tempo todo, Serginho procura solucionar rapidamente o que está a seu alcance: dá dinheiro quando a mãe pede, não hesita em pedir para a vizinha o botijão de gás que acabou em casa, dá banho no irmão menor. Com a mãe alcóolatra e o pai ausente, o garoto poderia se comportar de forma agressiva e delinquente, mas ele não rouba, não se droga, não se prostitui. Seu maior defeito talvez seja faltar à escola – o mínimo que poderia acontecer diante de tamanhas preocupações em casa.

Na busca pelo afeto paterno, Serginho encontra amparo no professor Ney, com o qual ficou amigo por causa das entregas das encomendas da feira. Há uma sutileza na construção do personagem interpretado por Irandhir: solitário e homossexual, ele parece ter atração por garotos, mas nada no filme aponta para a concretização do desejo. Ao contrário, ele até rejeita a proximidade com Serginho, que vê nele a figura do pai que escuta e dá conselhos.

Com exceção da sequência final – que desconstrói as intenções do protagonista de um modo um tanto quanto brusco, apressado e até grandiloquente –, Ausência é um filme de detalhes: basta perceber os olhares dos personagens, seus pequenos gestos, suas falas entrecortadas por silêncios. É bonito perceber este olhar terno do diretor em relação aos próprios personagens que constrói.

FICHA TÉCNICA
Título: Ausência
Gênero: Drama
Direção: Chico Teixeira
Elenco: Matheus Fagundes, Irandhir Santos, Francisca Gavilán, Gilda Nomacce, Thiago De Matos
Duração: 87 min.
País: Brasil
Ano: 2014
Classificação: 14 anos

Colaboração

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