Crítica de Filme | Foxcatcher: Uma História que Chocou o Mundo

Bruno Giacobbo

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19 de janeiro de 2015

Campeões olímpicos de luta greco-romana, em Los Angeles, 1984, os irmãos Mark e Dave Schultz personificavam uma das muitas facetas do sonho americano: homens e mulheres que a custa de muito trabalho e suor venceram na vida. Contudo, tirado das páginas dos livros escolares, este ideário que impulsiona toda uma nação não é tão perfeito assim. Apesar da glória olímpica, a realidade deles era dura. Faltava apoio financeiro e estrutura profissional para continuarem sonhando com uma segunda medalha. Já o excêntrico milionário John du Pont representava outra faceta deste mesmo sonho. Ele era um daqueles patriotas que se orgulhavam de descender dos pais fundadores da América, europeus que vieram para o Novo Mundo com a intenção de ganhar dinheiro e construir uma sociedade igualitária. Fabricante de armas, ornitólogo, filatelista, filantropo e pretenso treinador de luta greco-romana, seu caminho cruzou com o dos lutadores quando decidiu investir no esporte como forma reforçar seu patriotismo. O resultado do encontro explosivo entre estes três homens poderosos é uma tragédia habilmente narrada em Foxcatcher: Uma História que Chocou o Mundo, de Bennett Miller.

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O cineasta poderia, fácil e preguiçosamente, ter optado por rodar mais uma destas cinebiografias sobre dramas esportivos. OJ Simpson, Nancy Kerrigan e Tonya Harding, o que não faltam são personagens que se tivessem suas vidas levadas para os cinemas poderiam receber o mesmo epíteto. No entanto, ele decidiu realizar uma investigação psicológica nos moldes de “Capote” (2005), só que com um dinamismo bastante parecido com o de “O Homem que Mudou o Jogo” (2011), seus dois filmes mais famosos. Para isto, o excelente roteiro de Dan Futterman e Eric Max Frye foi uma arma fundamental. Nas entrelinhas, o texto conduz o espectador nesta viagem ao interior da mente e da personalidade de seus protagonistas. Os diálogos não são tão importantes. Já o silêncio, sim. É nesta hora que a câmera de Miller se aproveita para captar um olhar ou uma expressão que dizem mais do que muitas palavras. E no ritmo ideal, despertando a atenção do público para a cena seguinte, sem tornar o filme arrastado, em um meio termo perfeito entre as duas obras citadas.

Intérpretes, respectivamente, de Mark, Dave e du Pont, Channing Tatum, Mark Ruffalo e Steve Carrell estão excepcionais. O trabalho de composição e caracterização beira a perfeição. Tanto a aparência, ponto para a maquiagem, como o jeito de falar e andar, ponto para os atores, são verdadeiros achados. Nada disto é surpresa em se tratando de Ruffalo, um artista que a cada papel se mostra mais versátil, mas chega a surpreender quando pensamos que Tatum e Carrell, até pouco tempo atrás, eram muito subestimados. O primeiro por ser considerado apenas um rosto bonito; o segundo devido suas origens na comédia, gênero tido ainda de forma preconceituosa como menor do que o drama. Contudo, aqui não há o que reparar. Tatum está fisicamente igual a dezenas de lutadores reais. O raciocínio embotado de quem já levou porrada demais e as técnicas de luta são realistas. Por sua vez, Carrell convence ao compor um personagem sombrio, com extrema necessidade de impressionar e conquistar a admiração de quem está a sua volta. De longe, este é o melhor desempenho dos dois na carreira e tudo isto somado facilita a imersão no âmago da trama.

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Com cinco indicações ao Oscar, sendo quatro delas em categorias importantes como direção (Miller), ator principal (Carrell), ator coadjuvante (Ruffalo) e roteiro original (a quinta foi em maquiagem), o fato de Foxcatcher: Uma História que Chocou o Mundo não ter sido indicado, também, ao prêmio de melhor filme chama a atenção. Este esquecimento talvez passe pela forte crítica que a obra faz à ilusão de perfeição vendida pelo sonho americano, o que não deixa de ser uma crítica à sociedade ianque como um todo. Talvez, pois certeza mesmo só perguntando lá para a turma da Academia o porquê desta enorme injustiça.

Desliguem os celulares e ótima diversão!

BEM NA FITA: O roteiro, as atuações magníficas do trio de protagonistas, o trabalho de maquiagem que resultou em uma caracterização perfeita e a direção de Bennett Miller.

QUEIMOU O FILME: Nada. O filme é fascinante.

FICHA TÉCNICA:

Diretor: Bennet Miller.
Roteiro: Dan Futterman e Eric Max Frye.
Produção: Bennett Miller, Megan Ellison, Jon Kilik e Anthony Bregman.
Elenco: Steve Carell, Channing Tatum, Mark Ruffalo, Vanessa Redgrave, Sienna Miller, Anthony Michael Hall, Guy Boyd, Brett Rice, Samara Lee, Jackson Frazer, Jane Mowder, Daniel Hilt, Lee Perkins e David Bennett.
Música: Rob Simonsen e West Dylan Thordson.
Montagem: Stuart Levy, Conor O’Neill e Jay Cassidy.
Fotografia: Greig Fraser.
Duração: 134 min.
Ano: 2014.
País: Estados Unidos.

Bruno Giacobbo

Um dos últimos românticos, vivo à procura de um lugar chamado Notting Hill, mas começo a desconfiar que ele só existe mesmo nos filmes e na imaginação dos grandes roteiristas. Acredito que o cinema brasileiro é o melhor do mundo e defendo que a Boca do Lixo foi a nossa Nova Hollywood. Apesar das agruras da vida, sou feliz como um italiano quando sabe que terá amor e vinho.
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