Crítica de Filme: Grand Central
Giselle Costa Rosa
Não sabia bem o que esperar de uma história de amor permeando uma usina nuclear. Sentei-me e resolvi deixar o filme me levar sem amarras. Rebecca Zlotowski, em seu segundo longa como diretora, cujo roteiro é assinado por ela também, consegue desenvolver bem a trama. Gary (Tahar Rahim), sujeito bicho solto, sem qualificação profissional, entrelaçado por conflitos familiares, com zero de perspectiva em assuntos amorosos é jogado numa usina nuclear por uma agência de empregos, sendo decisivo na escolha sua falta de qualificação ou experiência no serviço.
Gary, no caminho para a usina, conhece e fica amigo de um batedor de carteiras, que curiosamente possuía o mesmo destino do que ele. Chegando lá, juntam-se aos demais rapazes, tão desqualificados profissionalmente quanto eles, para receberem um ínfimo treinamento que consistia basicamente em respeitar e seguir todas as normas rígidas de segurança, comunicar-se com precisão e carregar no peito um medidor de radioatividade. Fica bem claro que quanto mais próximo se está da base hierárquica da usina, mais o funcionário estará sujeito aos perigos da radioatividade, pois passará todo o período de trabalho exposto aos seus efeitos nocivos.
Nasce, muito provavelmente do incerto, a ideia de morte iminente, e dele o desejo de formar uma família tradicional e de ter os amigos sempre próximos. A prerrogativa é o trabalho em equipe sempre, dentro e fora da usina. Ali, todos cuidam uns dos outros.
Gary conhece e fica conhecido pelo pessoal local, em um bar regado à testosterona nas redondezas da usina, por domar o touro mecânico. É lá que ele conhece e fica amigo dos experientes Gilles (Olivier Gourmet) e Toni (Denis Ménochet – Bastardos Inglórios, 2009 e O Verão do Skylab, 2011).
Num jantar, Gary conhece a namorada libidinosa de Toni, Karole (Léa Seydoux – Azul é a Cor Mais Quente, 2013), que também trabalha na usina. Em meio ao papo introdutório sobre o serviço a ser realizado, Gary pergunta como é lidar com os riscos da radioatividade, com uma ameaça invisível. Karole lhe dá a explicação por meio de um beijo na boca. Em seguida, fala que os efeitos do beijo são semelhantes aos da radiação, ou seja, pode queimar por dentro e por fora. Não é difícil antecipar que a partir daí temos um triângulo amoroso.
O roteiro é consistente e não deixa a paixão solta na trama. Além disso, foca e traz em tom de crítica a exploração que a classe trabalhadora menos qualificada sofre e questiona o funcionamento das usinas nucleares. Fico imaginando como seria trabalhar num local onde o risco de morte está sempre pairando sobre os corpos. Como escolheria viver, o que daria ou deixaria de fazer pra sentir cada célula pulsar vertiginosamente em contato com o prazer.
Gary não tinha nada antes de ir pra lá. Provavelmente teria menos ao término do seu contrato – menos saúde com certeza. Pra Karole e ele não se tratava de um jogo. Aquilo era a vida lhes dando um presente. As contradições éticas e morais nesse momento são colocadas abaixo. Ela ainda refuga, reflete, vai e ensaia voltar pelo caminho traçado. São dois jovens que já não possuem mais o controle sobre seus desejos, desafiando o pacto dos demais – de um cuidar do outro. Por mais que se tenha receio existem coisas que não podemos evitar e assim fatalmente incidentes acontecem. O certo é que depois daquele beijo os dias ensolarados à beira do lago não foram mais os mesmos para aquelas famílias.
Confira o Trailer:
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BEM NA FITA: boa direção, roteiro consistente, e claro a madame Léa Seydoux.
QUEIMOU O FILME: narrativa com pouco ritmo.
FICHA TÉCNICA:
Nome: Grand Central
Direção: Rebecca Zlotowski
Roteiro: Gaëlle Macé, Rebecca Zlotowski
Elenco: Camille Lelouche, Denis Ménochet, Guillaume Verdier, Johan Libéreau, Léa Seydoux, Marie Berto, Nahuel Pérez Biscayart, Nozha Khouadra, Olivier Gourmet, Tahar Rahim
Produção: Frédéric Jouve
Fotografia: Georges Lechaptois
Montador: Julien Lacheray
País: França/Áustria
Gênero: Drama
Duração: 94 min
Ano: 2013