Crítica de Filme: Quando Eu Era Vivo

Bruno Giacobbo

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30 de janeiro de 2014

Existe uma luz no final do túnel, aleluia! Eu já estava cansado de reclamar dos filmes produzidos no eixo Rio-São Paulo, quase todos seguindo a mesma fórmula: comédia-televisiva que arrasta milhões de espectadores para trocentas salas de cinema, deixando, assim, fora do circuito películas com muito mais substância. Já estava cansado de escrever, também, que, hoje, infelizmente, os diretores mais criativos estão em Pernambuco. Precisei assistir o longa-metragem de um cineasta desconhecido do grande público, o paulista Marco Dutra, para ter certeza que a industria cinematográfica brasileira tem salvação.

Com estreia marcada para esta sexta-feira, dia 31 de janeiro, Quando Eu Era Vivo conta a história de um homem, Junior (o excelente Marat Descartes), que vai morar com o pai, Sênior (Antônio Fagundes), após ser abandonado pela esposa e o filho. De volta ao apartamento no qual passou toda a sua infância, ele descobre que seu antigo quarto está alugado. A inquilina é uma linda estudante de música chamada Bruna, interpretada pela surpreendente cantora Sandy Leah. Inicialmente tudo corre bem, mas, ao encontrar antigos objetos de sua falecida mãe e relembrar o passado, Junior percebe que voltar para o aconchego do lar talvez não seja uma experiência tão boa.

Baseado no livro “A Arte de Produzir Efeito Sem Causa”, do escritor e cartunista Lourenço Mutarelli, o grande mérito do trabalho de Dutra, que teve o roteiro escrito pelo próprio diretor em parceria com Gabriela Amaral Almeida, é transformar a história, originalmente um drama, em terror psicológico. Todas as nuances da conflituosa relação entre pai e filho estão ali. Contudo, tem algo mais. Algo com o qual o público brasileiro não está acostumado.

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Há muitos anos, o gênero terror está estritamente associado a um homem no Brasil: o ator e cineasta Zé do Caixão. No entanto, sem desmerecê-lo, suas obras estão muito mais próximas do terrir produzido por Sam Raimi, responsável pela cultuada trilogia “Evil Dead”, do que do terror propriamente dito. Ao rodar um longa-metragem influenciado por “O Iluminado” (1980), filme de Stanley Kubrick, a partir do livro de Stephen King, Dutra mostra que existem outros caminhos a serem trilhados no cinema nacional.

Para conseguir os resultados esperados, o diretor paulista e sua equipe usaram com competência iluminação, efeitos sonoros e música. A primeira parte de Quando Eu Era Vivo, quando Junior volta para o apartamento do pai, é bem clara. As janelas estão sempre abertas, a luz do dia é abundante. No entanto, aos poucos, a partir da hora que ele começa a vasculhar o passado, as cenas vão escurecendo. A mudança na iluminação serve para sinalizar uma mudança muito mais importante: no rumo da história.

Já o som funciona como elemento catalisador do aumento de tensão que, assim como o escurecimento do filme, também acontece aos poucos. Em uma tomada, por exemplo, o simples ranger de um velho portão remete aos barulhos que imaginaríamos ouvir em uma mansão mal-assombrada. A trilha sonora, por sua vez, além de cumprir a mesma função que o som, ajuda a contar a história, pois a personagem de Sandy tem participação crucial na trama.

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Ainda estamos no mês de janeiro, mas desde já, Quando Eu Era Vivo é uma das gratas surpresas do ano. Com uma direção firme e segura, o jovem Marco Dutra, apenas 33 anos, realizou uma película excelente, que não deixa nada a desejar as melhores obras norte-americanas do gênero. Vale cada gota de suor exalada nos momentos mais tensos.

Desliguem os celulares e boa diversão.

BEM NA FITA: Tudo. Roteiro. Iluminação. Trilha sonora e efeitos sonoros. As interpretações firmes de Marat Descartes, Antônio Fagundes e Sandy.

QUEIMOU O FILME: Absolutamente nada.

FICHA TÉCNICA:
Diretor: Marco Dutra.
Elenco: Marat Descartes, Sandy Leah, Antônio Fagundes, Gilda Nomacce, Kiko Bertholini, Helena Albergaria, Rony Koren, Tuna Dwek, Eduardo Gomes, Lilian Blanc, Carlos Albergaria, Marc Libeskind, Carla Kinzo, Caetano Gotardo, Lourenço Mutarelli e Wilhelmina McFadden.
Produção: Rodrigo Texeira e Rapahael Mesquita.
Roteiro: Marco Dutra e Gabriela Amaral Almeida.
Fotografia: Ivo Lopes Araújo.
Trilha Sonora: Guilherme e Gustavo Garbato.
Edição: Juliana Rojas.
Ano: 2012.
País: Brasil.

Bruno Giacobbo

Um dos últimos românticos, vivo à procura de um lugar chamado Notting Hill, mas começo a desconfiar que ele só existe mesmo nos filmes e na imaginação dos grandes roteiristas. Acredito que o cinema brasileiro é o melhor do mundo e defendo que a Boca do Lixo foi a nossa Nova Hollywood. Apesar das agruras da vida, sou feliz como um italiano quando sabe que terá amor e vinho.
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