Crítica de Filme | Serra Pelada

Pedro Lauria

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18 de outubro de 2013

Serra Pelada parece muito com um spin-off de Cidade de Deus. Pelo menos no que se diz em questões de estrutura narrativa e linguagem. Apesar do bom diretor Heitor Dhalia não conseguir, em nenhum momento, atingir a grandiosidade da obra de Fernando Meirelles, ele atinge um resultado satisfatório em um gênero que poucas vezes vimos no cinema brasileiro: o épico.

Contado a história do frenesi do ouro que representou a descoberta das minas em Serra Pelada, no Pará, o filme se utiliza de um instrumento recorrente em obras do gênero: a narração em off. Porém, ao contrário de Cidade de Deus, a natureza da narração aqui é completamente expositiva, tentando sublinhar sempre aquilo que está muito óbvio nas imagens ou então, substituir algumas cenas de forma preguiçosa.

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O recurso da narração ainda abre a possibilidade de uma montagem que abusa de elipses temporais. Ou seja, se um personagem vai ser assassinado, não temos a cena do planejamento – apenas ouvimos o narrador dizer: “então, X resolveu acertar as contas com Y”. E tão pouco a frase acaba, Y já está caído no chão morto. Essa falta de cenas de preparação (algum comum nas estruturas narrativas, sempre precedendo um evento importante) acaba por tirar a força de uma série de momentos cruciais da história, que acabam por passar de forma muito corrida.

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Este problema fica ainda mais marcado pela natureza imutável do protagonista interpretado por Juliano Cazarré (que consegue carregar um personagem não muito bem escrito, de forma extremamente competente). Seu personagem, que tem como mote, enriquecer ao lado do irmão (Júlio Andrade) nas minas de Serra Pelada, acaba sendo apenas um motor gerador de catástrofes, sempre movido pela ganância (lembrando o personagem de Humprey Boggart na obra prima “O Tesouro de Sierra Madre”) e que parece nunca se questionar sobre suas ações.

E se Júlio Andrade e Sophie Charlotte conseguem levar seus personagens – apesar da total falta de carisma de ambos (uma vez que passam o filme inteiro jogando a responsabilidade de seus atos nos outros, e nunca realizando aquilo que se prontificam a fazer) – são os dois “vilões” da película que transformam Serra Pelada em um experiência emocionante. Matheus Nachtergaele encarna uma criatura que apesar da aparência frágil, se mostra um ser nojento e de natureza napoleônica. Já Wagner Moura, dá trejeitos cômicos e tons doentios a um dos psicopatas mais marcantes do cinema nacional. Suas cenas (apesar de poucas) são hipnóticas.

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Abraçando sua natureza épica, Serra Pelada se mostra grandioso em se superar nos quesitos artísticos como Fotografia, Direção de Arte e Figurino. A obra consegue pontuar perfeitamente suas locações, seja no abismo de barro dos garimpos (cuja comparação com as pirâmides do Egito são perfeitas) ou na construção de uma “Las Vegas do Inferno”, que se resume o vilarejo do “Trinta”. O próprio tom documental empregado em algumas cenas (sejam recortes de jornais ou reportagens do Jornal Nacional) só ajuda a mostrar o quão fidedigna é a recriação daquele lugar que “transforma homens em monstros”.

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Apesar de prejudicados por alguns momentos do roteiro (que transforma o personagem de Cazarré em uma criatura unidimensional, proferindo frases como “Eu gostei de Matar”; ou cuja estrutura não parece muito bem amarrada) – que acabam por afetar a montagem e a direção (Dhalia, talvez pela natureza “frenética” da narrativa, acaba por exagerar nos cortes nas cenas de ação, tornando-as extremamente confusas) – Serra Pelada se mostra um épico competente e que conta uma história satisfatória.

Os méritos estão lá. E agradará aqueles que esperaram mais de uma década por um herdeiro direto de Cidade de Deus.

BEM NA FITA: Fotografia, Direção de Arte e Figurino te transportam temporalmente para aquele inferno de barro; Atuações magistrais de Matheus Nachtergaele e Wagner Moura.

QUEIMOU O FILME: Estrutura narrativa complicada, tanto na construção de alguns personagens, quanto na exposição de eventos

FICHA TÉCNICA:
Gênero: Drama / Épico
Direção: Heitor Dhalia
Roteiro: Heitor Dhalia, Vera Egito
Elenco: Juliano Cazarré, Júlio Andrade, Matheus Nachtergaele, Sophie Charlotte, Wagner Moura
Produção: Heitor Dhalia, Tatiana Quintella
Fotografia: Ricardo Della Rosa
Duração: 120 min.
Ano: 2013
Estréia: 18/10/2013

Pedro Lauria

Em 2050 será conhecido como o maior roteirista e diretor de todos os tempos. Por enquanto, é só um jovem com o objetivo de ganhar o Oscar, a Palma de Ouro e o MTV Movie Awards pelo mesmo filme.
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