Crítica de Filme | Sicario: Terra de Ninguém

Bruno Giacobbo

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21 de outubro de 2015

No auge do poder do Cartel de Medellín, no final dos anos 80 e início da década de 90, quando Pablo Escobar era o maior entre todos os mafiosos e um dos homens mais ricos do planeta, os colombianos controlavam 80% do comércio de drogas em todo o mundo. Contudo, a morte do capo, em dezembro de 1993, marcou o início de uma nova fase para o crime organizado internacional, com a ascensão do Cartel de Cali e dos diversos grupos mexicanos especializados em tráfico de entorpecentes. Ironicamente, o que pareceu, em um primeiro momento, uma grande vitória dos norte-americanos, já que, como maiores afetados pelas as ações destes cartéis, eles tiveram participação decisiva na caçada que culminou na queda de Escobar, com o tempo se revelou um desastre. A quebra do monopólio gerou uma guerra em múltiplas frentes de batalha, pois os Estados Unidos não tinham mais um único inimigo. Sicario: Terra de Ninguém, longa de Denis Villeneuve, começa exatamente no auge desta nova fase.

Kate Macer (Emily Blunt) é uma agente do FBI. Ela e seu parceiro, Reggie Wayne (Daniel Kaluuya), são os responsáveis por um grupo antissequestro, em Phoenix. O sucesso e os constantes resultados positivos conquistados ao longo dos últimos anos fazem com que ela desperte a atenção de Matt Graver (Josh Brolin), um graduado agente da CIA que está montando uma equipe de elite para tentar capturar o líder do Cartel de Sonora. Sem informações complementares, no escuro, mas decidida a fazer justiça, uma vez que os mexicanos ligados a este grupo estão por trás de boa parte dos casos que investigou, ela decide participar desta missão. Ao se embrenhar por terrenos desconhecidos, perceber que em uma guerra nem sempre se cumpre a lei; e se deparar com tipos misteriosos como Alejandro (Benício Del Toro), Macer reforçará sua fé em tudo aquilo que acredito ser correto.

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Em filmes como este, principalmente no cinema de Hollywood, um risco frequente que se corre é o da justificação de um eventual mau passo do herói sob a égide de que os fins justificam os meios. Ou, em outras palavras, aquela velha história dos Estados Unidos como polícia do mundo. Na excelente série do Netflix, “Narcos”, produzida por José Padilha, que narra a ascensão e a queda de Escobar, para validar uma transgressão da lei, o agente do DEA, Steve Murphy, diz que bandidos não jogam pelas regras, que isso os faz serem maus e, talvez, os faça vencer. Ao raciocinar assim, ele está antecipadamente validando qualquer outro ato ilícito, desde que este tenha um fim nobre. Este comportamento é visto ao longo do filme, mas em momento nenhum é o discurso oficial adotado tanto pela direção como pelo roteiro. Ele está na boca de alguns dos postulantes ao cargo de herói, porém, sempre com a oposição ferrenha da protagonista, que não se verga e insiste em agir dentro dos ditames da lei.

O filme em si não chega a ser uma mega produção no quesito efeitos especiais ou espetáculo pirotécnico, muito embora as cenas onde se faz uso da visão infravermelha, própria para combates noturnos, sejam hipnóticas. E não precisava mesmo ser assim. Villeneuve já provou em outros trabalhos, “Incêndios” (2010) e “Os Suspeitos” (2013), por exemplo, que, no cinema atual, poucos sabem tirar proveito da tensão como ele faz em seus longas. Os primeiros 20 minutos são uma aula de como prender a atenção dos espectadores. Nada está acontecendo, mas você sabe, sem medo de parecer óbvio, que a qualquer instante acontecerá algo. Passados estes momentos iniciais, outras cenas igualmente tensas e bem dirigidas surgem impedindo que a obra caia na pasmaceira. Tudo emoldurado por uma fotografia belíssima e uma trilha sonora de arrepiar.

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Com um conjunto de grandes atuações, onde brilham Blunt, Del Toro e Brolin, Sicario: Terra de Ninguém possui outros detalhes que engrandecem o longa consideravelmente. O título é um deles. A referência explícita é a figura do matador de aluguel. Na América Latina, assassinos profissionais que trabalham para os diversos cartéis criminosos da região recebem este nome. Contudo, na antiguidade, sicários era os judeus radicais que perseguiam os romanos. Em uma referência histórica, os sicários modernos não são os criminosos e, sim, os soldados norte-americanos responsáveis por perseguirem os traficantes estrangeiros de drogas. Há de se destacar, ainda, prestando atenção em uma escolha que a protagonista faz em seu último ato, a mensagem que Villeneuve quis transmitir. De forma sutil e eficaz, ela encerra qualquer discussão em relação às intenções do filme.

Desliguem seus celulares e excelente diversão.

(Filme assistido no 17º Festival Internacional de Cinema do Rio de Janeiro).

FICHA TÉCNICA:

Direção: Denis Villeneuve
Roteiro: Taylor Sheridan
Produção: Basil Iwanyk, Edward McDonnell, Molly Smith, Trent e Thad Luckinbill.
Elenco: Emily Blunt, Benício Del Toro, Josh Brolin, Daniel Kaluuya, Dylan Kenin, Jeffrey Donovan, Jon Bernthal, Alan D. Purwin, Julio Cedillo, Kaelee Vigil, Lora Martinez-Cunningham, Maximiliano Hernández, Raoul Trujillo, Sarah Minnich e Victor Garber.
Direção de Fotografia: Roger Deakins.
Trilha Sonora: Jóhann Jóhannsson.
Montagem: Joe Walker.
Duração: 121 minutos.
País: Estados Unidos.
Ano: 2015.

Bruno Giacobbo

Um dos últimos românticos, vivo à procura de um lugar chamado Notting Hill, mas começo a desconfiar que ele só existe mesmo nos filmes e na imaginação dos grandes roteiristas. Acredito que o cinema brasileiro é o melhor do mundo e defendo que a Boca do Lixo foi a nossa Nova Hollywood. Apesar das agruras da vida, sou feliz como um italiano quando sabe que terá amor e vinho.
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