CRÍTICA | ‘Em Ritmo de Fuga’ é a obra que faltava a Edgar Wright

Bruno Giacobbo

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26 de julho de 2017

Hollywood é o palco de todas as tribos. Os críticos da indústria norte-americana, que insistem em achar que o único cinema bem feito é o produzido na Europa ou na Ásia, parecem se esquecer disto. Nos Estados Unidos, há espaço para tudo que é tipo de filme. Há espaço até para um profissional viver da sua arte sem jamais trabalhar para um dos grandes estúdios. Drama ou qualquer outro gênero, se vocês pararem um minuto para pensar, provavelmente, o primeiro longa-metragem que virá a mente foi feito por lá, em terras ianques. De tempo em tempo, um determinado gênero pode estar mais em voga ou moda do que outro. No entanto, com tantas oportunidades, logo vem alguém e dá uma sacudida naquele que estiver mais esquecido. Oriundo da Grã-Bretanha, o diretor e roteirista Edgar Wright pavimentou seu caminho, na “Meca da Sétima Arte”, com uma trilogia em que brinca com algumas das principais temáticas hollywoodianas. Estas películas foram um sucesso e lhe deram a chance de realizar “Scott Pilgrim Contra o Mundo” (2010) e de ser um dos roteiristas de “Homem-Formiga” (2015), da Marvel. Contudo, ainda faltava uma grande obra para chamar só de sua.

CRÍTICA #2 | ‘Em Ritmo de Fuga’ entretém o espectador pela criatividade exposta em linguagem sonora e visual

Com um casting recheado de velhas e novas estrelas do cinema e da televisão americana, diferentemente da trilogia que utilizava como protagonistas humoristas britânicos, Em Ritmo de Fuga (Baby Driver) é a obra que faltava ao cineasta. Um dos longas mais aguardados da temporada, é também a bem-sucedida incursão de seu criador no chamado subgênero de ‘filmes de assalto’, temática que há muito não tinha uma película tão emblemática e precisava de uma sacudida. Na história, Ansel Elgort é Baby, um ás do volante que surpreende por dirigir melhor do que Bobby Rahal ou Mário Andretti, mesmo tendo cara de quem acabou de sair da adolescência. Literalmente um garoto, ele trabalha como piloto de fuga para Doc (Kevin Spacey), um poderoso gângster que vive da organização de audaciosos e lucrativos assaltos. A cada golpe, os comparsas podem variar. No primeiro, nos deparamos com Buddy (Jon Hamm), Darling (Elza Gonzalez) e Griff (Jon Bernthal). Já no segundo, um dos envolvidos é Bats (Jamie Foxx). O único que nunca muda é o motorista. Aliás, ele é uma espécie de talismã do chefão. Qual é a real relação entre Baby e Doc? Por que alguém tão novo participa destes crimes? Estas perguntas serão respondidas ao longo da trama.

Baby é um cara, digamos, peculiar. Um traço de sua personalidade que fica nítido, logo de cara, é a sua eloquência, para não dizer o contrário. Quase não fala e parece estar sempre no mundo da lua. Facilmente, poderia ser rotulado como portador de algum grau de autismo. No entanto, não é isto que ocorre. Como descobriremos no decorrer da história, existe um motivo para ele ser assim. Sua relação mais íntima é com a música, com o pai adotivo, Joe (CJ Jones), e, depois, com Débora (Lily James), uma garçonete igualmente apaixonada por todo tipo de canções. Sem a companhia de seu indefectível iPod, dá para dizer que o protagonista não faria nenhuma das peripécias que faz ao volante. É uma ligação quase umbilical. Desta forma, a trilha sonora dita o humor do personagem principal e de todo o longa-metragem. Ela é praticamente um ente independente que, com singles de bandas que vão de Queen a The Beach Boys, passando por um hit de Simon & Garfunkel que batiza o filme em inglês, embala todos os momentos mais eletrizantes. Com a exceção de “Guardiões da Galáxia Vol. 2”, será impossível assistir à uma obra este ano em que as músicas sejam tão onipresentes e importantes quanto aqui. Cuidado, há um enorme risco de vocês começarem a dançar em pleno cinema.

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Desde os primeiros teasers e trailers, um detalhe chamava a atenção: o elenco. Wright conseguiu reunir no mesmo set gente como os oscarizados Kevin Spacey e Jamie Foxx; o astro televisivo de “Mad Men”, Jon Hamm, e jovens promessas do naipe da delicada Lily Collins. No final das contas, a combinação foi explosiva! Todos estão excelentes e é para lá de perceptível que as filmagens devem ter sido bastante divertidas. Todavia, se eu tivesse que apontar um único destaque, este seria Ansel Elgort. Cantor e DJ nas horas vagas, o ator se revelou uma escolha mais do que acertada do diretor para o papel. Não é exagero dizer que o garoto carrega a música em seu âmago e que esta relação simbiótica empresta total credibilidade a sua atuação. Aliás, eu não classificaria bem como uma atuação, na verdade, o que este jovem intérprete faz está mais para uma performance do que para qualquer outra coisa. Além de interpretar e cantar, o seu trabalho corporal em algumas cenas de ação, onde visivelmente dispensou a utilização de um dublê, é formidável. Ainda é cedo para falarmos em Oscar, contudo, eu acredito que, com o carisma magnético demonstrado neste trabalho, Elgort tem potencial de sobra para chegar com fôlego à temporada de prêmios de 2018.

O segredo do sucesso desta ópera cinematográfica recheada de ação desenfreada, perseguições de carros e rajadas de balas que pipocam por todos os lados, é Edgar Wright. Seu cinema autoral inseriu frescor aos “filmes de assalto” ao misturar estes elementos. Havia, claro, a chance de que tudo parecesse exagerado demais, mas isto não ocorreu. O cimento deste mix fílmico é o caprichado roteiro de autoria do próprio cineasta que, em alguns momentos, evoca clássicos do subgênero em questão. Seus diálogos, quase sempre dotados de uma verborragia calcada em frases de efeito, remetem aos de “Cães de Aluguel” (1992), de Quentin Tarantino. Pode-se dizer que a escrita do britânico é aparentada com a do americano: ambas impregnadas de um humor peculiar. Por outro lado, o script é repleto de situações de enfrentamento bem construídas envolvendo seus personagens principais e estas, por sua vez, espelham a tensão vivida por Al Pacino e Robert De Niro, em “Fogo Contra Fogo” (1995), de Michael Mann, ainda que de forma mais descontraída. Dito isto, se Em Ritmo de Fuga não chega a ser a reinvenção da roda, é impressionante como tudo nele funciona perfeitamente.

Desliguem os celulares e excepcional diversão.

TRAILER:

FOTOS:


FICHA TÉCNICA:
Título original: Baby Driver
Direção: Edgar Wright
Elenco: Ansel Elgort, Lily James, Jamie Foxx, Jon Bernthal, Jon Hamm
Distribuição: Sony
Data de estreia: qui, 27/07/17
País: Reino Unido
Gênero: ação
Ano de produção: 2016
Classificação: 14 anos

Bruno Giacobbo

Um dos últimos românticos, vivo à procura de um lugar chamado Notting Hill, mas começo a desconfiar que ele só existe mesmo nos filmes e na imaginação dos grandes roteiristas. Acredito que o cinema brasileiro é o melhor do mundo e defendo que a Boca do Lixo foi a nossa Nova Hollywood. Apesar das agruras da vida, sou feliz como um italiano quando sabe que terá amor e vinho.
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