CRÍTICA | Roteiro atrapalha voo de ‘Passageiros’ rumo ao sucesso

Bruno Giacobbo

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5 de janeiro de 2017

O norueguês Morten Tyldum não é um passageiro de primeira viagem, muito pelo contrário. Segundo o IMDB, maior banco de dados cinematográficos da internet, ele tem 23 trabalhos creditados como realizador. Porém, até dois anos atrás era muito pouco conhecido. Ele voou em direção a fama com “O Jogo da Imitação” (2014), película britânica indicada ao Oscar e que lhe rendeu, também, a chance de disputar a estatueta de melhor diretor. Nem um dos dois levou, mas as portas para novos e ousados voos já estavam escancaradas. Com a fama veio a oportunidade de trocar o assento da classe executiva pelo banco de piloto de uma grande produção. Passageiros (Passengers) contou com um orçamento de US$ 110 milhões, uma das maiores estrelas de Hollywood (Jennifer Lawrence) e um dos galãs mais cobiçados da atualidade (Chris Pratt). O que poderia dar errado? A empreitada cheirava a sucesso, uma autêntica viagem de primeira classe, contudo, diante desta expectativa, o resultado não foi o esperado. 

A história se passa em um futuro distante. A Terra é um formigueiro: populosa demais e com escassez de recursos econômicos, embora isto não seja dito claramente. Em compensação, o homem alcançou um nível de desenvolvimento tecnológico nunca visto, adquirindo, assim, a capacidade de colonizar novos planetas. O engenheiro mecânico Jim Preston (Pratt) e a escritora Aurora Lane (Lawrence) são dois dos 5000 passageiros que estão a bordo da Avalon, uma nave destinada a estabelecer uma colônia em um destes mundos. Como a viagem até lá está prevista para durar 120 anos, todos, inclusive os tripulantes, estão em estado de hibernação. Nesta toada, o filme não teria para onde se desenvolver. É aí que ocorre o problema que serve para por em funcionamento as  engrenagens desta trama: um defeito na câmara de congelamento faz com que Jim acorde mais cedo. Um ano depois será a vez de Aurora. No entanto, entre um despertar e outro, há muito tempo ocioso.

Tanto Chris Pratt, como Jennifer Lawrence, estão ótimos. A química do casal é bem perceptível em Passageiros. Contudo, é necessário dizer que alguns dos melhores momentos são protagonizados pelo galã. Ainda sozinho, em uma nave colossal, ele precisa descobrir o que fazer para não enlouquecer. A verdade é que existem muitas opções: jogar basquete, jantar em um restaurante caro ou nadar em uma piscina de onde dá para vislumbrar o espaço sideral infinitamente. Mas estes atrativos não são tão interessantes quando sua única companhia é um barman robótico, Arthur (Michael Sheen). Com o tempo, nada mais é novidade e a aparência de Jim adquire ares de Chuck Noland (Tom Hanks), em “O Náufrago” (2000). O sentimento nos dois casos é parecido: a vontade de fazer qualquer coisa para sobreviver dá lugar a um terrível desânimo.

Com o despertar de Aurora (inequivocamente, o mesmo nome da Bela Adormecida), a película também adquire novos ares e o drama solitário, por sua vez, dá lugar a um drama romântico tipo “Titanic” (1997). Em uma situação normal, os protagonistas não trocariam sequer um aceno. Eles são de classes sociais totalmente distintas. Forçados a conviver, acabam encontrando apoio um nos braços do outro para seguir em frente. É aqui que a química do casal fica evidente e que um dilema ético (que mostra que este não é apenas um entretenimento para as massas) ganha força. Não dá para revelar muito mais sobre ele. Só que o nascedouro está na solidão que afligia Jim anteriormente. Como  enamorados, seja na Terra ou em Avalon, eles têm altos e baixos; e em momento algum, para a nossa sorte, o romance descamba para um melodrama piegas.

Se as atuações, o dilema ético e as referências a clássicos recentes; somados aos excepcionais trabalhos de desenho de produção (a nave é um enorme cenário construído para o filme) e efeitos especiais tinham tudo para fazer de Passageiros o sucesso esperado; o roteiro acabou atrapalhando ao adotar soluções fáceis para resolver determinadas questões. Além disto, alguns de seus diálogos são simplórios e constituídos de mensagens que não precisavam ser ditas com palavras. Um deles, o que eu gravei com mais nitidez, é protagonizado por Gus Mancuso (Lawrence Fishburne), personagem que só tem sua existência justificada por conta da ajuda que acaba prestando ao casal, devido ao fato de ser um dos tripulantes. Excetuando isto, sua presença na história é completamente dispensável. Contudo, nada justifica uma micro ponta feita, lá pelo final, por um ator de relativo renome.  A menos, claro, que ele estivesse precisando de uma grana extra para pagar uma viagem em uma nave como Avalon.

Desliguem os celulares e boa diversão.

TRAILER:

FICHA TÉCNICA:
Título original: Passengers
Direção: Morten Tyldum
Elenco: Jennifer Lawrence, Chris Pratt, Michael Sheen
3D
Distribuição: Sony
Data de estreia: qui, 05/01/17
País: Estados Unidos
Gênero: ficção científica
Ano de produção: 2016
Classificação: a definir

Bruno Giacobbo

Um dos últimos românticos, vivo à procura de um lugar chamado Notting Hill, mas começo a desconfiar que ele só existe mesmo nos filmes e na imaginação dos grandes roteiristas. Acredito que o cinema brasileiro é o melhor do mundo e defendo que a Boca do Lixo foi a nossa Nova Hollywood. Apesar das agruras da vida, sou feliz como um italiano quando sabe que terá amor e vinho.
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