CRÍTICA | Todos os elogios são poucos para ‘Tungstênio’

Wilson Spiler

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21 de junho de 2018

Baseado na excelente HQ de Marcello QuintanilhaTungstênio talvez seja uma das mais fiéis adaptações de quadrinhos já feitas não só no cinema brasileiro. Tão forte quanto a obra literária, o filme de Heitor Dhalia, que estreou nesta quinta-feira, 21, em circuito nacional, tem tantos aspectos positivos que fica difícil enumerar todos, mas vamos tentar.

Diretor e atores abordam narrativa atual e importante da HQ de Quintanilha em pré-estreia de ‘Tungstênio’

Tungstênio é focado, basicamente, em quatro personagens: Richard (Fabrício Boliveira), Keira (Samira Carvalho), Seu Ney (José Dumont) e Caju (Wesley Guimarães). Além disso, a produção toda gira em cerca de dois, três cenários quase inteiramente – salvo exceções – explorando a faceta crua e real de Salvador, na Bahia, sem qualquer tipo de esteriótipo e preconceito. São quatro histórias diferentes, mas interligadas, que expõem na tela os erros de cada relação humana, onde nenhum herói é perfeito e nem todo vilão é tão cruel.

Richard (Fabrício Boliveira), é um policial que atua movido por seus instintos, custe o que isso custar, uma espécie de anti-herói que vive toda a agressividade da profissão, intensificada pela criminalidade presente nos grandes centros urbanos. Ele vive um caloroso romance com Keira (Samira Carvalho), mas a hostilidade do seu mundo chega também ao seu lar, transformando sua vida profissional e pessoal em um verdadeiro caos. Ela, por sua vez, ameaça o tempo todo abandonar o marido, mas não o faz porque, segundo a própria, ainda não tem emprego que a deixe independente o suficiente para se sustentar sozinha. Do outro lado, Seu Ney (José Dumont) é um ex-sargento do Exército, saudoso de sua vida na caserna e sedento pela época em que os militares eram os donos do pedaço. Enquanto  Caju (Wesley Guimarães) é um pequeno traficante cujo principal interesse é sobreviver mais um dia.

Na véspera da estreia, Heitor Dhalia fala sobre Tungstênio

A história começa quando dois pescadores (Pedro Wagner Sérgio Laurentino) começam a utilizar explosivos para pescar na orla da capital baiana. Seu Ney, um sargento do Exército aposentado, decide acabar com esse crime ambiental com as próprias mãos e envolve Caju. O jovem, um traficante de “meia tigela”, por sua vez, é obrigado a acionar um policial que foi “camarada” com ele em certa oportunidade, justamente Richard, que vive uma relação conflituosa sua esposa Keira.

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Embora o roteiro de Tungstênio seja aparentemente banal, as atuações são tão espetaculares e a mão do diretor Heitor Dhalia é tão presente em cada frame que o filme não deixa o espectador respirar. Os takes, ângulos escolhidos pelo cineasta são de uma felicidade ímpar. Repare na foto abaixo: imagine essa cena, aliada a um trabalho de som impecável e uma direção de arte fabulosa. O impacto é sem igual.

Como disse acima, todos os elogios são poucos para Tungstênio. Em boa parte, o filme usa o característico som do berimbau para dar o tom das cenas. A História diz que o instrumento foi levado pelos escravos angolanos para o Brasil, o que, por si só, já diz muito sobre sua representatividade para a película. O longa-metragem aborda temáticas atuais importantes como o racismo enraizado em nosso país, a exclusão social e o autoritarismo militar que muitos querem ver de volta (até pela falta de estudos) após tantos escândalos de corrupção.

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Mas, talvez a questão mais forte que o filme trata é a do feminismo. Keira é uma mulher forte, que embora “se conforme” com a relação ruim que tem com Richard por falta da independência financeira, se rebela e enfrenta seu marido, o que causa espanto dele. Sua transformação durante a projeção é nítida. Mas seus sentimentos internos também são conflituosos. Embora ela mesma diga que não o ama em voz alta e clara para a amiga, quando fica sozinha, a própria assume o alívio de poder ser quem é de verdade e aceitar que o carinho não foi embora. Sim, a raiva está ali, o que não anula o outro sentimento. São coisas que o coração não explica, só sente, e ninguém pode julgar. O final pode deixar algumas mulheres insatisfeitas – ou não – nesse quesito, o que não diminui em nada a qualidade da produção.

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Tungstênio vai num ritmo desenfreado. A escalada da tensão conduz a relação emissor-receptor à negação dos próprios sentimentos. Em uma busca desenfreada por escolher os caminhos que lhes pareçam mais corretos, os personagens, inevitavelmente, enfrentam conflitos pessoais diante da impossibilidade de seguir à risca suas escolhas racionais. Volto a elogiar porque vale a pena: a direção de arte é um espetáculo à parte. A fotografia também vale o ingresso, assim como cada atuação. O final é angustiante e o desfecho tem um plot twist dos mais interessantes, onde lembra o início da resenha: não existe o herói perfeito e nem todo vilão é tão cruel.

::: TRAILER

::: FOTOS

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::: FICHA TÉCNICA

Direção: Heitor Dhalia
Elenco: Fabrício Boliveira, Samira Carvalho, José Dumont, Wesley Guimarães
Distribuição: Pagu Pictures
Data de estreia: qui, 21/06/18
País: Brasil
Gênero: drama
Ano de produção: 2017
Classificação: 16 anos

Wilson Spiler

Will, para os íntimos, é jornalista, fotógrafo (ou ao menos pensa que é) e brinca na seara do marketing. Diz que toca guitarra, mas sabe mesmo é levar um Legião Urbana no violão. Gosta de filmes “cult”, mas não dispensa um bom blockbuster de super-heróis. Finge que não é nerd.. só finge… Resumindo: um charlatão.
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