Crônica Desnatalina

Antonio de Medeiros

****Colaboração de Patty, A Crítica Bipolar****

Entrei na loja de roupas e consegui me esquivar de duas vendedoras. Me fiz de distraída e surda, driblei duas, mas a mais chata me seguiu. Apertei o passo e me meti entre as camisolas. Ela me alcançou, se apresentou, perguntou meu nome e ofereceu ajuda. Com um movimento leve de cabeça, fui gentil e deixei claro que não precisava.

Fugi para outro setor. Ela me seguia. Até que eu parei, a encarei, levantei a bengala. Ela deu meia volta e saiu. Eu respirei.

“A senhora já foi atendida?” -Outra apareceu. “Sim, já me perturbaram, obrigada.”

Levei a camisola escolhida até o provador.

-“A senhora já….”

SIM! – cortei a pergunta e me tranquei no provador.

“Já experimentou, senhora?”

“Querida, nem se eu fosse do Circo de Soleil!”

De orelha colada no provador, ouvi os passos irritados dela se afastando. Aproveitei o ensejo, mirei reto no caixa.

“Quem ajudou a senhora?- a moça do caixa perguntou, me denunciando.

“Ajudar ninguém, mas me perturbar umas 3!”

Nesse momento, as duas vendedoras mais chatas apareceram, como gaviões e disputavam quem tinha me atendido. Não posso dizer que fiquei lisonjeada, fiquei nauseada com a pequenez daquelas vendedoras.

“Vão as duas pra merda! Não vou levar mais nada!”

Deixei a camisola no balcão. Sai da loja, dobrei a esquina e pedi a Deus que chegasse logo o Carnaval.

Para me recuperar dessa situação de estresse traumático pré-natalino, depois de uns shots de bom uísque, fiz essa pequena oração para todos que precisam atravessar esse período do ano:

Neste Natal,
Que eu não tenha que participar de nenhum amigo oculto,
Que eu não tenha que ir ao shopping lotado,
Que eu não assista ao especial do Roberto Carlos,
Que não toque Simone,
Que não roubem a guirlanda da minha porta,
Que eu não escute o jingle da loja Leader,
Que eu não invente de montar árvore e depois ter que desmontar tudo,
Que eu não tenha que ir pra Lagoa,
Que eu não tenha que contribuir com tudo que é caixinha,
Que alguém se lembre do aniversariante,
Que haja rabanada e não amêndoas,
Que salgado seja apenas o bacalhau,
Que alguém acredite em espírito natalino,
Que alguém ainda receba um cartão de Natal,
Que chegue logo o Carnaval,
Amém!

*DESENHO: Ilustrices

Antonio de Medeiros

Antonio de Medeiros apenas digita os textos entregues pela própria Patty, ou por seu sobrinho Fernandinho, em papeizinhos escritos à mão (cartõezinhos amarelados de fichamento) ou datilografados, às vezes manchados de café ou quase sempre de whiskey. Ela me fez prometer que eu não modificaria nem uma única vírgula. De modo que não me responsabilizo por sua opinião e pitacos. (Antonio De Medeiros é formado em Turismo pela UniRio. Atualmente, é funcionário público. Passou pela CAL e pela Escola de Cinema Darcy Ribeiro. Ama Cinema, Literatura e Teatro. Sonha em ser escritor. Enquanto escreve peças e um romance, colabora para o site "Blah Cultural")
NAN