Diretor de ‘Borrasca’ fala sobre o filme e lamenta perda de incentivos

Karinna Adad

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2 de maio de 2019

“Gabriel, um escritor amargurado, e o piloto de helicópteros Diego, conversam logo após a morte de um terceiro amigo. Um deles vai ao enterro e o outro se recusa a ir, pois foi traído pela ex-mulher com o amigo morto. Os dois reavaliam as suas vidas enquanto relembram passagens em comum com o falecido, colocando em xeque aqueles que querem continuar e os que simplesmente preferem ficar pelo caminho.”

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Essa é a sinopse de “Borrasca”, filme do diretor Francisco Garcia, que estreia nesta quinta-feira (2) em circuito nacional. O BLAH!ZINGA conversou com o cineasta, que falou um pouco sobre o filme, a carreira e o momento do cinema brasileiro. Confira o bate-papo:

BLAH!ZINGA: ‘Borrasca’ é uma adaptação de uma peça de Mário Bortolotto. Qual foi a ideia da adaptação e como foi transpor essa linguagem teatral para o cinema?

Francisco Garcia: Eu tenho uma parceria com o Mário (Bortolotto) já faz alguns anos. Ele foi protagonista de um curta-metragem de 2008 muito premiado chamado “A Cauda do Dinossauro”, baseado em obra original do cartunista Angeli. A partir dali, a gente começou a se aproximar. Eu comecei a conhecer melhor a obra dele e, há uns cinco anos, eu vi essa peça. É um texto que são dois atores dentro de um apartamento e eu estava interessado em desenvolver um filme de baixo orçamento dentro de um espaço único. Nós conversamos e chegamos à conclusão de que o texto fosse apropriado. A partir dali, eu chamei os dois atores da peça e nós filmamos o longa-metragem em duas madrugadas, basicamente, e três anos depois eu consegui colocar o filme em cartaz.

BLAH!ZINGA: Qual a importância da integração da música com a trama em algumas cenas? O objetivo era dar um ar de naturalidade?

FG: Ele (o filme) tem uma trilha sonora composta pelo próprio Mário Bortolotto e pelo Marcello Amalfi, um maestro de São Paulo bastante importante que faz música para o teatro há muitos anos. É um filme que tem uma importância de som muito grande porque tem muito diálogo. A ideia foi tentar transcrever para o audiovisual com uma linguagem cinematográfica muito influenciada pelos trabalhos de John Cassavetes (ator e cineasta considerado o ‘pai’ do cinema independente dos Estados Unidos), que vem do teatro independente de Nova Iorque. Com isso, incentivamos uma transcrição do teatro para o audiovisual tentando manter uma certa integridade e fidelidade ao texto teatral.

Francisco Garcia, diretor de “Borrasca” (Foto: Divulgação)

BLAH!ZINGA: Qual a mensagem final do filme? A amizade parece ser mais forte do que as adversidades.

FG: A mensagem cada um leva a sua, mas o filme, na verdade, está falando muito sobre as relações de amor e amizade. Há um terceiro amigo que nunca é visualizado, mas que é o vértice da trama, né? Esse terceiro personagem que nós nunca vemos talvez tenha uma importância maior do que os dois que estão dialogando, porque tudo gira em torno dessa figura que acabou de falecer. Então, na verdade, tem um certo ressentimento por parte dos personagens pelo fato de terem sido traídos pelo melhor amigo. Eu acredito que esse triângulo de amizade sem que você veja o terceiro elemento é o ponto mais original dentro da própria dramaturgia da peça que a gente tentou levar para o audiovisual.

BLAH!ZINGA: Como tem sido a recepção de ‘Borrasca’ nos festivais pelo qual passou?

FG: Ele foi premiado internacionalmente no Festival de Santa Maria da Feira, em Portugal, onde o Mário (Bortolotto) estava concorrendo com Matheus Nachtergaele, um dos filmes que estavam indicados era “Elis”, sobre a cantora Elis Regina… Então, era filmes de orçamento muito grande e nós chegamos humildemente com um pequeno levando o prêmio de Melhor Ator. O mesmo aconteceu no Cine PE, um dos festivais de maior importância do país.

Bastidores de “Borrasca” (Foto: Divulgação)

BLAH!ZINGA: Falando em filme de baixo orçamento, como tem sido fazer cinema no Brasil hoje? Como fica a produção nacional com essa questão de cortes no patrocínio da Petrobras para festivais, na Lei Rouanet, no repasse de verbas da União para a Ancine…?

FG: Eu vejo, na verdade, não só com o cinema, mas com a cultura em geral e com a educação, esse governo é um equívoco. Esse governo de direita do PSL, com o nosso equivocado presidente Bolsonaro, tem receio, medo dos artistas. Para não ter nenhuma contrariedade, ele vem tentando minar a arte no País. Isso realmente é um problema porque sem cultura um país não tem história. Eu torço cada vez mais para que esses quatro anos passem o quanto antes, essa que é a verdade.

BLAH!ZINGA: E faça o menor estrago possível, né?

FG: Eu queria dormir e acordar amanhã sabendo que já se passaram quatro anos. Eu, por exemplo, estou com quatro projetos contemplados em editais, estava para assinar contrato e esse contratempo com o Tribunal de Contas da União (TCU) me deixou sem prumo. Não só eu como todos os meus amigos de São Paulo e do Brasil que dependem da cultura não sabem o que fazer. Esse governo, além de equivocado, não se pronuncia. É um governo mentiroso.

Bastidores de “Borrasca” (Foto: Divulgação)

BLAH!ZINGA: Falando um pouco sobre sua trajetória. Há uma predileção por filmes para dirigir ou depende muito do projeto?

FG: Acho que cada projeto é um projeto. Eu comecei efetivamente a dirigir curtas-metragens na década passada, que foram muito premiados em festivais nacionais e internacionais. Eu dirigi meu primeiro longa-metragem em 2013, que se chama “Cores”. O filme foi lançado no San Sebastian Film Festival (Competição Internacional Novos Diretores), ganhou Melhor Filme em Lisboa, enfim, foi uma produção bastante repercutida. Nesse momento, estou lançando o “Borrasca” e estou com outros dois longas-metragens em pós-finalização, sendo uma outra adaptação de uma peça do Mário Bortolotto que chama “Uma Pilha de Pratos na Cozinha”, talvez o texto mais importante dele, e um outra película que se chama “A Praia do Silêncio”, que é um acerto de contas entre um pai ausente e uma filha surda. Eu tinha acabado de fazer duas adaptações de teatro, que são filmes muito verborrágicos, com muito texto, e eu queria me reinventar artisticamente, optando por fazer um trabalho onde praticamente não tem diálogo, onde os personagens se comunicam pelas emoções e não por palavras, diferente das adaptações teatrais.

“Borrasca” estreia nesta quinta-feira, 2, nos melhores cinemas do País. Leia a nossa crítica e veja o trailer logo abaixo.

::: TRAILER

https://youtu.be/RedhI0cBdro

Karinna Adad

Tranquila, mas multitarefada. Sou daquele tipo de pessoa que sempre está fazendo alguma coisa e descobrindo outras tantas pelo caminho. Topo qualquer parada desde que tenha prazer nela e uma das que por mais tempo vem me enchendo de alegria é a escrita. E como boa leitora consigo escrever sobre quase qualquer coisa, por mais que, como uma cientista social em formação, não consiga deixar de fazer agir meu raio problematizador nos meus textos.
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