Entrevista | Lúcia Murat, diretora do filme ‘Em Três Atos’

Juliana Góes

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11 de outubro de 2015

Em Três Atos, filme de Lúcia Murat, ganhou sessão de estreia no último domingo (04/10) no Festival do Rio 2015. O longa traz nomes de peso no elenco, como as aclamadas atrizes Nathalia Timberg e Andrea Beltrão, além das bailarinas, Angel Vianna, ícone da dança contemporânea nacional, e Maria Alice Poppe. A história propõe uma experiência fascinante, onde duas épocas da vida são mostradas de forma poética, através da dança e diálogos inspirados nos livros da autora francesa Simone de Beauvoir.

>> LEIA A CRÍTICA DO FILME ‘EM TRÊS ATOS’

Lúcia Murat, conhecida pelos premiados filmes “Quase Dois Irmãos” e “A Memória Que Me Contam” contou durante entrevista, detalhes sobre seu último projeto “Em Três Atos”. Confira a entrevista que o BLAH CULTURAL fez com a cineasta.

BLAH CULTURAL: Há muitos filmes no mercado cinematográfico que retratam o envelhecimento e morte, mas o seu filme é diferente pela maneira de mostrar a metamorfose da vida por um ensaio-poema. O que te inspirou a fazer isso?

Lúcia Murat: Estou completando 67 anos e estou passando por essa experiência. Quando a Simone de Beauvoir escreveu sobre esse tema, ela enfrentava essa realidade também. É um filme a partir de uma experimentação.  Eu vi o espetáculo original “Qualquer Coisa a Gente Muda” com a Angel Vianna e Maria Alice Poppe, e pensei em  filmar esse espetáculo de maneira diferente, porque são dois corpos trabalhando,  uma senhora de 85 anos e uma bailarina no auge de seu vigor físico. Resolvi trabalhar com esses dois corpos, o auge e a velhice, mas que tem capacidade de expressão muito grande. Pensei em agregar isso com os textos de Simone de Beauvoir, que foi uma das pessoas que mais tratou sobre esse tema. E no decorrer da minha pesquisa descobri um livro dela que eu não conhecia chamado “Uma Morte Muito Suave” (1964) que é sobre dor da perda da mãe dela. Juntei essas ideias e criei essas duas duplas, o ciclo da vida sendo mostrado pelos dois corpos através da dança, e uma intelectual hoje com 80 anos e a intelectual com 50 anos diante da perda da mãe. A partir daí, construí o filme em um período de três anos. Como não é um filme tradicional demora muito para chegar num resultado.

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BC: Talvez algumas pessoas se identifiquem com a personagem, tanto os jovens quanto os mais velhos. Você acha que o filme levanta essa questão sobre a valorização da vida?

Lúcia Murat: A gente vive numa sociedade que tem a fantasia da juventude, a exigência do corpo, diferente de uma cidade oriental onde a velhice é prestigiada, a sabedoria é vista num velho. Então acho que o filme levanta a questão da importância da pessoa idosa dentro da sociedade, o quanto ela pode oferecer alguma coisa.  Acho que o filme termina otimista, com aquela frase “eu amo a juventude, é nela que está a esperança”. Fiquei até muito impressionada na sessão do filme, como as pessoas ficaram emocionadas e vieram falar comigo. De qualquer maneira, alguém já perdeu um ente muito querido e enfrentou essa questão da morte. As pessoas se identificam com um dos dois personagens.

BC: Porque a escolha da dança contemporânea?

Lúcia Murat: A dança contemporânea tem essa liberdade. Eu fui bailarina quando jovem, muito apaixonada por dança, e ainda trabalho com isso. Acho que a dança contemporânea tem uma abertura que a clássica não tem. A clássica só permite fazer performance acrobática , exigindo que o seu corpo esteja no auge, já a dança contemporânea explora outro aspecto do corpo, ela permite que uma pessoa de 85 anos dance.

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BC: Ao longo da sua vida você se deparou com esse dilema, o medo de perder alguém ou de envelhecer?

Lúcia Murat: Sim, acho que a perda dos pais é uma coisa muito triste. A Simone de Beauvoir fez um livro lindo sobre isso (Uma Morte Muito Suave). A Andrea Beltrão e a Natalia Timberg, duas grandes atrizes, trabalharam muito bem nessa questão em lidar com o texto literário, em mostrar a beleza do texto. Então, essa experiência eu já tinha vivido, e a experiência de começar a envelhecer estou vivendo agora. Foi isso, especificamente o que me levou a fazer o filme, sobre esta experiência que estou vivendo agora.

BC: Diante desses dois medos retratados no filme, qual seria o pior? Que perturba mais?

Lúcia Murat: Eu gosto muito daquele texto que ela fala: “O que faz meu equilíbrio atual é a presença de um certo número de pessoas em torno de mim. É um equilíbrio que pode ser ameaçado pela morte, a morte dos outros.” É exatamente isso que achei interessante, a dor que você sente, a raiva quando você perde alguém muito querido. A raiva dela quando perde a mãe, a raiva da morte, da juventude, e quando se reproduz na velhice.

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BC: Sobre trabalhar com os textos de Simone de Beauvoir

Lúcia Murat: Sou da geração que leu muito Simone de Beauvoir nos anos 70.  É obvio que alguns textos são meus, mas os textos mais lindos do filme são dela. Tenho uma profunda admiração, é uma super escritora, e talvez tenha sido difícil para atrizes compor isso, que é mais para serem lidos e não para serem ouvidos.  Essa composição é que foi difícil, por que foram dois livros dela e a gente construiu um raciocínio ali dentro. Foram essas duas dificuldades: a construção do raciocínio e o trabalho das atrizes.

Em Três Atos terá distribuição da Imovision e tem estreia prevista para o dia 10 de dezembro deste ano. Confira o vídeo promocional do filme:

Juliana Góes

Leonina, carioca, adora filmes e séries, apaixonada pelos animais, e não vive sem chocolate...
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