Fernanda Montenegro 90 anos

Fernanda Montenegro, 90 anos de puro talento

Wilson Spiler

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16 de outubro de 2019

Arlette Pinheiro da Silva Torres. Talvez você não saberá de quem estamos falando por esse nome. Agora, se citarmos Fernanda Montenegro… Aí, certamente você já ligou o nome à pessoa.

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O início

Com 70 anos de carreira, a atriz nascida em 16 de outubro de 1929 é considerada uma das maiores artistas deste país. Muito conhecida da TV e do cinema, sua carreira, entretanto, começou no rádio. Aos 15 anos, Fernanda, ainda no terceiro ano do curso técnico de secretariado, inscreveu-se num concurso como locutora na Rádio MEC. Chamado de “Teatro da Mocidade”, o concurso era voltado para jovens talentos do radialismo. Então, já na emissora – que, até hoje, fica ao lado da Faculdade Nacional de Direito da UFRJ – ela conheceu um grupo de teatro amador dos alunos da universidade, coordenado pelo professor Adauto Filho. Não demorou muito e a aspirante a atriz se juntou aos estudantes. Em seguida, participou da peça “Nuestra Natascha”, interpretando sua primeira personagem, Cassona. Posteriormente, foi levada pelo professor Adauto para participar de atividades no Teatro Ginástico.

Como nasceu o nome ‘Fernanda Montenegro’

No rádio, sua primeira participação como atriz foi na radionovela de Cláudio Fornari, “Sinhá Moça Chorou”, onde interpretou Manuela. Fernanda permaneceu no rádio por 10 anos. Lá, ela começar a escrever e adotou o pseudônimo “Fernanda Montenegro”. Mas por que esse nome? Fernanda por homenagem à literatura francesa, um nome comum representado nessas obras, nos livros que lia. Já Montenegro, por conta de Doutor Montenegro, médico que cuidava pessoalmente de sua família.

Fernanda Montegro (Arquivo Nacional)

Fernanda Montegro no início da carreira (Foto: Arquivo Nacional)

Primeiros trabalhos

A peça Alegres Canções nas Montanhas, ao lado de seu marido, Fernando Torres, foi seu primeiro trabalho no teatro profissional. Além disso, Fernanda foi a primeira atriz contratada pela recém-criada TV Tupi do Rio de Janeiro, em 1951. Lá, atuou entre 1951 e 1953, participando de cerca de 80 peças. Já na Record TV, em 1954, interpretou sua primeira protagonista na telenovela A Muralha, de Ivani Ribeiro. Entre 1956 e 1963, a atriz participou de diversos teleteatros na TV Tupi de São Paulo. Então, em 1959, formou sua própria companhia teatral, a Companhia dos Sete, com Sérgio Britto, Ítalo Rossi, Gianni Ratto, Luciana Petruccelli, Alfredo Souto de Almeida e Fernando Torres.

Reconhecimento nacional

Sua estreia em novelas da TV Globo veio em 1981, em “Baila Comigo”, de Manoel Carlos. A personagem Sílvia Toledo Fernandes foi escrita especialmente para a atriz, que foi dirigida por Roberto Talma e Paulo Ubiratan. No mesmo ano, viveu a milionária Chica Newman de “Brilhante”, novela de Gilberto Braga. Mesmo com a censura impondo mudanças nos personagens, diálogos e cenas, ainda assim, esta última novela foi um sucesso e recebeu diversos prêmios da Associação Paulista de Críticos de Arte, entre eles o de melhor atriz para Fernanda Montenegro.

Em 1993, uma de suas atuações mais marcantes: Jacutinga, a dona de um bordel no interior da Bahia, na primeira fase da novela “Renascer”, de Benedito Ruy Barbosa. Ainda em 1993, participou – como Madalena Moraes – da novela “O Mapa da Mina”, a última de Cassiano Gabus Mendes. Já em 2006, outro papel incrível: brilhou na novela “Belíssima”, como a vilã Bia Falcão, matriarca da família Assumpção. A trama de Sílvio de Abreu prendeu a atenção dos telespectadores até o último capítulo, quando a personagem de Fernanda Montenegro, em vez de receber a esperada punição, terminou numa suíte em Paris ao lado do jovem Matheus (Cauã Reymond).

Bia Falcão Fernanda Montenegro

Fernanda Montenegro como Bia Falcão, em “Belíssima” (Foto: Kiko Cabral / TV Globo / Divulgação)

Mundo descobre o talento de Fernanda Montenegro

O que todos nós já sabíamos, foi a vez do mundo descobrir. Em 1999, por sua atuação no filme “Central do Brasil” (1998), de Walter Salles, Fernanda Montenegro foi a primeira artista brasileira a ser indicada para o Oscar de Melhor Atriz. Um ano antes, ainda por sua atuação naquele filme, recebeu o Urso de Prata do Festival de Berlim. Ainda em 1999, a atriz fez o papel de Nossa Senhora na minissérie “O Auto da Compadecida”, adaptação da premiada peça de Ariano Suassuna feita por Guel Arraes, Adriana Falcão e João Falcão, e transformada em filme no ano seguinte.

Já em 2004, foi escolhida melhor atriz da terceira edição do Festival de TriBeCa. Ela foi premiada por sua atuação em “O Outro Lado da Rua”, único filme da América Latina a participar da competição de longas de ficção. Por fim, em 2012, protagonizou o último episódio da minissérie “As Brasileiras” como a artista decadente Mary Torres no episódio Maria do Brasil, e no especial de fim de ano, Doce de Mãe, em que interpretou Dona Picucha, personagem principal onde foi premiada com o Emmy Internacional de melhor atriz.

Central do Brasil Fernanda Montenegro

Fernanda Montenegro em “Central do Brasil”, filme que lhe rendeu uma indicação ao Oscar (Foto: Divulgação)

Fernanda Montenegro na política

Ao contrário de muitos artistas, Fernanda Montenegro evita se envolver diretamente com política, embora lute por suas causas. Em 1985, a atriz foi convidada para ocupar o Ministério da Cultura no governo do presidente José Sarney. O fato ocorreu também em 1992, quando Itamar Franco assumiu após o impeachment de Fernando Collor de Mello. Contudo, apesar do grande apoio da classe artística e intelectual, a artista recusou ambas as ofertas. Ao recusar os convites, ela afirmou que não estava preparada para abandonar a carreira artística, não por medo ao desafio que lhe era oferecido, mas por entender que seria muito melhor no palco do que no ministério.

Recentemente, mais precisamente, no último dia 23 de setembro, o dramaturgo Roberto Alvim, atual diretor do Centro de Artes Cênicas da Funarte, escreveu nas redes que sentia “desprezo” por Fernanda Montenegro, a quem chamou de “mentirosa” e “sórdida”. As críticas foram motivadas pela capa da revista Quatro Cinco Um, que mostra a atriz vestida de bruxa numa fogueira de livros.

“A ‘intocável’ Fernanda Montenegro faz uma foto pra capa de uma revista esquerdista vestida de bruxa. Na entrevista, vilipendia a religião da maioria do povo, através de falas carregadas de preconceito e ignorância. Essa foto é ecoada por quase toda a classe artística como sendo um retrato fiel de nosso tempo, em postagens que difamam violentamente o nosso presidente”, escreveu o dramaturgo.

Em tempos difíceis como esses em que vivemos, onde a cultura é deixada de lado e vista como coisa de “esquerdista”, bem como Fernanda Montenegro é tida como preconceituosa e ignorante, mais do que nunca, precisamos reverenciar essa dama da dramaturgia brasileira. Salve, Fernanda! Que você perdure muitos anos por aqui e seu legado seja eterno. Enfim, ouça, veja, sinta, aproveite Fernanda Montenegro.

Wilson Spiler

Will, para os íntimos, é jornalista, fotógrafo (ou ao menos pensa que é) e brinca na seara do marketing. Diz que toca guitarra, mas sabe mesmo é levar um Legião Urbana no violão. Gosta de filmes “cult”, mas não dispensa um bom blockbuster de super-heróis. Finge que não é nerd.. só finge… Resumindo: um charlatão.
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