O aplicativo que está redefinindo a literatura

Colaboração

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31 de março de 2014

Pense numa rede social com mais de 20 milhões de ativos usuários. Imagine que esta consuma cinco bilhões de minutos de conexão por mês. Considere algo beirando a casa dos 80 milhões de comentários postados sistematicamente. Assente-se tudo num universo heterogênico, indo do vampirismo ao humor, passando pela história da vida, do universo e tudo mais. E com muito romance também.

Facebook!

Não.

Wattpad.

Cá não houve manifestação disléxica. É Wattpad mesmo, de modo que as semelhanças com outro aplicativo param por aí. Trata-se de uma rede de leituras, para ficarmos na superfície da definição. Um universo paralelo dedicado à produção e consumo (e vivência!) de uma novíssima literatura digital, feita em – e para – smartphones.

Criada por Ivan Yuen e Allen Lau (este último fã de Ayrton Senna), a rede existe desde 2006. Anterior ao Kindle e ao iPhone, portanto. Em seu primeiro ano de vida, disponibilizou 17 mil obras de domínio público. Não vingou. A partir de 2011, ao receber aportes do fundo nova-iorquino Union Square Ventures, um dos primeiros financiadores do Twitter e Zynga (casa do game “Farmville”) ganhou fôlego. Mas foi com a popularização dos smartphones, da produção original dos seus seguidores e do compartilhamento social que decolou.

Angry Birds, Walking Dead e Barack Obama

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Embora possua catálogo de obras clássicas, o que faz sucesso são as “fanfics”, histórias criadas por fãs, baseadas em séries de TV e games. Em 2013 foram publicadas sete milhões, incluindo aquelas inspiradas em produtos como “Angry Birds” e “The Walking Dead”, sem contar com “Star Wars”, por supuesto.

Personalidades da cultura pop também não escapam. E o presidente dos Estados Unidos não foi poupado. Ele é a inspiração de “Barackoli”, cujo personagem é – pasmem! – um Obama versão brócolis. A história é uma paródia de quando ele saiu em defesa do legume, em campanha por uma melhor alimentação. Logo ele, amante declarado de junk food. No país da Dieta Paleolítica, must no Vale do Silício, virou piada.

 Uma mistura de rede social com leitura coletivizada

Já são 40 milhões(!) de “livros” gratuitos; um acervo que faria a biblioteca de Alexandria parecer uma banca de jornal de esquina. “A cada minuto, 10 horas de leitura vão ao ar”, afirma Lau. Bom negócio, posto que a Amazon, cujo catálogo tem derrubado livrarias tradicionais, possui pouco mais de dois milhões de e-books. No Wattpad, leitores são ativos e estão em contato direto com autores. Comentam de parágrafos a frases, numa proximidade inédita com a obra e seu criador. Influenciam a ponto de fazer o autor mudar os rumos da história, levando o conceito de obra aberta ao extremo. Os comments abrigam milhares de pessoas discutindo apaixonadamente a leitura de trechos à medida que são escritos, em tempo real. Uma verdadeira meta-rede. Incrível.

 Fenômeno editorial ganha as telas de cinema

Nas Filipinas, “Diary ng Panget” (“Diario da Feiosa”, tradução livre) traz o cotidiano de Eya, jovem batalhadora que se acha feia e acaba de ganhar uma bolsa de estudos numa escola de bacanas – uma gauche, diria Drummond. Trata-se de um conto de fadas moderno, com direito a todos os clichês do gênero. Um sucesso entre 18 milhões de leitores.

Pois o fenômeno transcendeu a diminuta tela dos smartphones e chegou a liderar a lista de bestsellers filipino. Nada mal para Deny, uma jovem de 20 anos que o escreveu “nas horas vagas de tédio durante intercâmbio na Itália”, segundo confidenciou. E o caminho para a grande tela foi natural: “Diary ng Panget” estreia nos cinemas dia 2 de abril, numa das mais aguardadas premiéres asiáticas. Por enquanto, apenas do outro lado do globo.

Mas aqui você confere o trailer (legendas em inglês):

Serviço

Wattpad está disponível para Android e iOS

Alguns “bestsellers”:

“Diary ng Panget”

“The Love Curse”

“After” (Harry Styles Fanfic).
para a versão em português, siga por aqui.

“Angel with a shotgun (Walking Dead funfic)”

“Angry Birds”

“Barackoli”

 *Emiliano Mello é jornalista e pesquisador. Apronta por aí desde os tempos da internet discada. Editor de vídeo, mata no peito, corta pra direita, corta pra esquerda e põe onde a coruja dorme. É rock do bom ou, quem sabe, jazz.
Foto: Jeremy Mates/Flickr

Colaboração

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