Sobre a Intimidade

José Danilo Rangel

1.
Não sei pra vocês, mas pra mim, sexo
não é essa coisa toda, não sempre,
essa comunhão de entes que se buscam
sôfregos e por um momento, se encontram,
no êxtase maior de sua humanidade.
Às vezes, é só o bom fim de uma noite boa,
em que você dançou, bebeu e acertou
na conversa fiada, uma brincadeira a mais
pra se divertir. Você está afim, ela também está,
a carne fala, vocês ouvem, acontece.
A mecânica da sacanagem é essa.
Às vezes, é só instinto, tesão,
e então, não é muito diferente
do que fazem os cachorros na rua.
E nisso, não tem nada de intimidade.
2.
Intimidade
é compartilhar o incompartilhável,
a beleza difícil e improvável dos dias comuns,
e isso não é coisa tão bonita como nos romances
em que as mulheres são fadas sem intestinos
e os homens só aparecem limpos e perfumados.
Dar as mãos cotidiano afora, a dentro, pelos
dias de turbulência e de marasmo, lidar com as
questões práticas, hora de lavar as louças, hora de
escovar os pés, cortar as unhas, esfregar a casa,
Estar perto é isso, é conhecer e se deixar conhecer,
nos momentos da privacidade, permitir espiadelas
e também espiar. Abrir mão da carapaça com
que encontramos o mundo e dele nos protegemos,
com que o atacamos.
Alguém que veja como você acorda e vai dormir,
e como se irrita por ir pagar as contas do mês
num banco ou numa lotérica onde dez mil outras pessoas
também o fazem, alguém que veja você andar
sempre de calção (só de calção) pela casa e resistir
a tomar banho num dia frio, alguém que sabe como
você é em casa não só nos seus melhores momentos,
que já viu você com dor de dente e foi comprar analgésico,
a esse alguém você pode chamar de íntimo.
3.
Muitos vão ouvir os seus sonhos e mesmo
aquilo que tiver de mais obscuro, sua história,
seus relatos, glória e miséria, vão pegando por aí,
aos poucos, o pouco que por aí deixar transparecer,
ou declarar naquelas noites em bares ou pubs ou em
conversas pela faculdade, pelo trabalho, por aí,
Mas o dia a dia, a parte da vida que não está
nos filmes ou nos seriados, o passar das horas,
o que não se conta, só a quem queremos perto
damos permissão para espiar e mesmo olhar
abertamente.
E se a pessoa olha você no seu dia a dia
e fica e se enrosca em você, não só com braços e pernas,
então você pode falar, dos seus recreios libidinosos,
foi um momento de intimidade, um encontro.

José Danilo Rangel

José Danilo Rangel tem 29 anos, é cearense, de Itaitinga, vive há 20 anos em Porto Velho, Rondônia, e já foi conhecido nas rodas undergrounds portovelhenses, por ser esportista radical e pela frequência (e confusões) em festas de metal. Sempre leu muito, mas não gostava de Poesia, na verdade, considerava-a futilidade. Escrevia artigos, crônicas, contos, mas nada em verso. Apaixonado, entanto, decidiu escrever um soneto para se declarar, foi assim que encontrou na Poesia um meio de falar sobre o que sempre achou importante falar.
NAN