Ao Seu Lado
Crítica do filme
Roberto Baggio foi talvez o último jogador de uma geração que não existe mais. Um tipo de futebolista que se importava com o jogo, que sofria por cada erro, do tipo que amávamos ver em campo.
No Brasil, ele é amado pelo pênalti perdido na final da Copa do Mundo de 1994 que nos deu o tetracampeonato mundial. Todos nos lembramos onde estivemos nos momentos mais importantes, que também são os mais difíceis, da vida de Roberto Baggio. Lembramos quem amamos, quem estava do nosso lado ou porque queríamos tanto aquela Copa.
Certamente esse momento é peça fundamental de qualquer biografia que se preze a contar a história de Roberto Baggio. No entanto, em O Divino Baggio (Il Divin Codino), filme de ficção que estreia hoje (26) na Netflix, esse chute pra fora é somente uma parte do que foi a carreira de um dos maiores jogadores italianos de todos os tempos.
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O pênalti perdido na final da Copa do Mundo de 1994 marcou a vida de Roberto Baggio e talvez o perturbe até hoje. Entretanto, o filme da diretora Letizia Lamartire parte deste momento para mostrar um jogador que superou lesões, desilusões e difíceis relações familiares, em especial com o pai.
Assim, logo em suas primeiras cenas, em Vicenza, seu primeiro clube, Baggio dá uma entrevista onde lhe é perguntado se ele seria o futuro do futebol italiano. O atleta, interpretado por Andrea Arcangeli, responde de forma tímida e humilde. Aqui, vemos o que foi o craque, sempre um personagem tímido e reservado. O que para muitos pode ter parecido desagradável, era simplesmente ele mesmo, um jogador de futebol que se preocupava muito com a privacidade.
Então, se formos puxar direto para o seu declínio na seleção italiana, entre 1998 e 2000, veremos Francesco Totti, o protótipo do futebolista de hoje: midiático, extrovertido, social. É por isso que O Divino Baggio é um filme importante. Não só porque retrata somente o jogador, o homem, mas também uma época.
Os roteiristas Ludovica Rampoldi e Stefano Sardo encenaram Roberto Baggio (um Andrea Arcangeli muito bom e comedido) enfocando três momentos fundamentais onde cada um representa um ponto crítico, uma adversidade que conteve o campeão ajudando-o a se preparar melhor para um desafio posterior: a lesão no Vicenza na semana em que se tornou o jovem de 18 anos mais bem pago da Itália pela transferência à Fiorentina e o subsequente encontro com o Budismo; a expedição aos EUA em 94, da complexa relação com o técnico Arrigo Sacchi até o pênalti perdido na final contra o Brasil; seu último momento de glória com o Brescia e a decepção final com o fracasso de Giovanni Trapattoni em o convocar para a Copa do Mundo de 2002, quando a seleção italiana seria eliminada pela Coreia do Sul.
Como cinema, O Divino Baggio é impressionante na recriação da época através da direção de arte. Os gols e jogadas de Baggio, entre vários outros momentos, são encenados exatamente como aconteceram. Aliás, é colocada até mesmo o clássico momento onde Baggio observa Romário de longe, minutos antes de entrarem em campo.
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Mas se o filme tem algum problema, podemos dizer que se trata de um filme sobre futebol que não foi feito para conhecer o jogador. Quem nunca ouviu falar dele, não verá Baggio sendo bicampeão italiano por Juventus e Milan e até campeão da Copa da Uefa (hoje Liga Europa) pela Velha Senhora. Nem mesmo sabe que ele jogou a Copa de 1990 na Itália, e que teve uma outra disputa de pênaltis em 1998, na França, contra a seleção local, onde mesmo eliminado posteriormente, converteu seu penal e fez o sinal de “calem a boca” para seus detratores. Até o prêmio de melhor jogador do mundo – conquistado em 1993 – é retratado timidamente.
Por conta disso, O Divino Baggio é um filme para iniciados no futebol dos anos 90. Não sendo o caso, uma boa visita no YouTube fará a experiência com a película ser mais interessante. Mas há algo mágico no longa ainda assim. Afinal, Roberto Baggio é o único jogador de futebol italiano vivo a quem podemos atribuir plausivelmente a palavra “campeão” em seu sentido mais amplo. Tanto dentro como fora de campo, a vida do ‘Divino Codino’ (Divino Rabo-de-Cavalo) está intimamente ligada aos italianos.
Baggio tenta combater as adversidades. Tenta contar um pouco sobre cada um de nós. As nossas esperanças, nossas alegrias, nossos fracassos. E se frustra. Tem raiva. Chora. Qualquer um se humaniza justamente porque em tempos de Neymar e cia., ver algo sobre um jogador que pagou um preço altíssimo por seu talento é extraordinário. Assim, Roberto Baggio é mais ou menos para os italianos o que Ronaldo Fenômeno é para nós.
Ao final do filme, entendemos perfeitamente porque o destino quis que ele perdesse aquele pênalti. No Brasil, país onde um chute ou defesa determina que lugar da história você estará, isso jamais aconteceria. Só lembrarmos de Barbosa, por exemplo, goleiro que disse ter pago mais anos que qualquer criminoso por ter sofrido o gol na final da Copa de 50.
Entretanto, Roberto Baggio era mais do que um campeonato mundial de futebol. Sua vitória era o amor de seu povo. Ele conquistou isso como ninguém.
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Título original do filme: Il Divin Codino
Direção: Letizia Lamartire
Roteiro: Ludovica Rampoldi, Stefano Sardo
Elenco: Andrea Arcangeli, Valentina Bellè, Andrea Pennacchi
Onde assistir ao filme ‘O Divino Baggio’: Netflix
Data de estreia: qua, 26/05/21
País: Itália
Gênero: biografia
Ano de produção: 2021
Duração: 92 minutos
Classificação: 12 anos