Uma Noite de Doze Anos traz no título exatamente o retrato da experiência destes guerrilheiros que faziam parte do grupo denominado Tupamaros, que lutava contra a ditadura militar no qual seu país, Uruguai, vinha enfrentando. Foram 12 anos reclusos, 12 anos de martírio.

EXCLUSIVO | “Filme nos leva a refletir sobre a volta do autoritarismo”, diz produtora do aclamado ‘A Outra História do Mundo’

E por que uma noite de 12 anos? Noites longas, em 12 anos, confinados onde não podiam ou conseguiam saber que o dia havia passado. O raiar do sol lhes foi impedido, a visão das estrelas e da lua também, as pequenas janelas dos cubículos onde estavam foram cobertas por tapumes furados para que eles ao menos tivessem um pouco de ar. Os militares do Exército viviam passando pelo local de confinamento, urinando neles, rindo deles, dando comida estragada, ração, jatos d’água para que passassem frio, entre outros tipos de tortura com as quais estes citados se entretinham. E tudo isso por quê? O filme não aborda os motivos, não entra no contexto da situação daquela época do país, fazendo somente algumas menções históricas através de relatos ouvidos nas rádios e contendo uma cena especifica para mostrar quando e como eles foram presos.

CRÍTICA | ‘Coração de Cowboy’, a previsível história de um filho que volta para casa

Uma Noite de Doze Anos consegue transmitir bem a angústia da prisão através das imagens, mixagem de som e trilha sonora muito bem dirigidas e elaboradas, que fazem o espectador entrar no filme e sentir à flor da pele as emoções dos protagonistas. Dirigido por Álvaro Brechner, o longa mostra todo o sofrimento pelos quais José Mujica (Antonio de la Torre), Mauricio Rosencof (Chino Darín) e Eleuterio Fernández Huidobro (Alfonso Tort), passaram na prisão durante os doze anos da ditadura militar que assolou o país deles. O trio foi proibido de conversar entre si ou com os guardas, e privado de tudo, até mesmo de visitação de familiares, que é permitida a prisioneiros de guerra, pois há uma lei que dá esses direitos. Familiares iam até a prisão para tentar visitação e levavam pertences, mas nunca eram entregues a eles.

CRÍTICA | ‘Um Pequeno Favor’, um thriller cômico de tirar o fôlego

O filme não retrata os pormenores da ditadura, nenhum contexto histórico, mas a visão deles da história, focada em sentimentos e sensações. Eles eram vistos como rebeldes, e para uma pátria ditatorial, eram somente rebeldes sem causa. Passaram por momentos turbulentos de fome, de frio, de saudade de seus familiares e amigos, mas, nesses doze anos de reclusão, encontraram formas de manter a mente lúcida.

CRÍTICA| ‘PéPequeno’ traz uma mensagem filosófica sobre amizade, coragem e alegria da descoberta

Foto: Vitrine Filmes / Divulgação

Um deles, por exemplo, tinha habilidades poéticas e, com isso, conseguiu algumas “regalias”. Ao conseguir ajudar um dos soldados, a se dar bem com sua namorada através de uma carta, a notícia se espalha e um homem de função importante no Exército pede ajuda, dizendo que precisa conquistar uma garota. Mais adiante da trama, este mesmo homem, já casado com a mulher em questão, dá a eles um “presente”: a possibilidade de ver as estrelas e sair ao sol em conjunto. São pequenos alívios que eles têm em 12 anos e que os espectadores também sentirão.

CRÍTICA | ‘A Primeira Noite de Crime’ tem mais violência e respostas para os fãs da franquia

Trata-se de uma trama sensorial que se perde no meio do caminho, mas sempre tem algo que resgata quem assiste. Ha uma cena em que Pepe quase enlouquece e fica preso em seus pensamentos que foi muito bem desenhada. A cena inicial da prisão vista com uma câmera girando em 360 graus também é um take perfeito. São 4380 dias, contados pouco a pouco. A mudança do passar dos anos é mostrada através de números na tela, que mostram 1973 inicialmente como o primeiro ano de reclusão, passando por 1977 – 1460 dias; 1979 – 2190 dias; e assim por diante, até a chegada do ano de 1985, quando foram libertos.

CRÍTICA | ‘O Homem Perfeito’ é divertido e tira o espectador da zona de conforto

Foto: Vitrine Filmes / Divulgação

O contraste de luz e sombra, a bela fotografia criada para levar o espectador de volta às décadas de 60 e 70, as músicas escolhidas para representar a época, sendo que, uma delas, “The Sound Of Silence”, arrepiou até a alma, pois deixou a marca do que foi para eles viverem esses 12 anos sem poder se comunicar com ninguém.

CRÍTICA | Com boas críticas sociais, ‘A Moça do Calendário’ desperdiça seu potencial cômico

Uma Noite de Doze Anos transita entre memórias dos três presos, passado, contexto atual de seu cárcere, indo e voltando constantemente, o que pode deixar o espectador confuso. Mas esse é um filme que, no atual contexto social e político que o Brasil se encontra, e na temida possibilidade de ser ter uma ditadura retomada, é de suma importância para conscientizar a população de que a voz silenciosa dói na alma.

::: TRAILER

::: FICHA TÉCNICA

Título original: La Noche de 12 Años
Direção: Alvaro Brechner
Elenco: Antonio de La Torre, Chino Darín, Alfonso Tort
Distribuição: Vitrine Filmes
Data de estreia: qui, 27/09/18
País: Uruguai, Argentina, Espanha
Gênero: drama
Ano de produção: 2018
Duração: 122 minutos
Classificação: 14 anos