Ao Seu Lado
Crítica do filme
Embora pareça mais uma história do jovem que ganha um sentido na vida ao lidar com o mais velho, Sabor da Vida, de Naomi Kawase, não se basta nesta definição. Baseado no livro An, de Durian Sukegawa, o filme entrega sua trama principal logo na primeira sequência, mas é aos poucos que vamos conhecendo seus personagens e entendo sobre o que ele quer falar: distância, isolamento, solidão e a descoberta de um sentido apesar da vida.
Na trama, Sentaro administra uma pequena loja de dorayakis – panquecas recheadas com pasta de feijão azuki. A loja tem um movimento padrão e é frequentada por colegiais, entre elas, Wakana, uma solitária e pobre filha de mãe solteira que está prestes a deixar os estudos para trabalhar. Sentaro a ajuda, guardando para ela as panquecas que passam do ponto. A vida de Sentaro e da loja de dorayakis começa a mudar quando Tokue, uma simpática e humilde senhora de 70 anos, se oferece para ajudá-lo na cozinha. O sonho de Tokue era poder trabalhar, e trabalhar na cozinha, mas as mãos deformadas por uma enfermidade a proibiram de sonhar. Apesar de certa relutância, Sentaro é convencido ao experimentar a melhor azuki que já comera. Graças à nova receita, o pequeno negócio evolui e Sentaro e Tokue se aproximam. Mas a doença e o preconceito do mundo além das janelas da pequena loja acabam criando barreiras que farão a boa receita desandar.
É difícil falar do tema sem estragar as revelações. No entanto, embora toque em feridas históricas do Japão, o que vale no filme é o encontro de solidões. Três gerações distintas vivem diferentes tipos de exclusão, três gerações que se aproximam para se completar. Três solidões que precisam umas das outras para conseguir se libertar (e há metáfora bem direta disso no decorrer do filme).
O tratamento do longa segue a sutileza da cinematografia de Naomi Kawase. O forte peso de dor carregada pelos personagens contrasta com a suavidade com que a narrativa segue. A fotografia, sempre clara, lavada, traz não apenas o tom das folhas das cerejeiras – a natureza como personagem vivo no filme, mas acompanha a pureza e positividade solar da alma de Tokue.
A construção dos personagens durante o roteiro é sutil. Às vezes, tão sutil que falta informação – principalmente à história de Wacana – para se completar. Os personagens secundários surgem um pouco como bengalas para fazer a história seguir ou justificar uma ação, mas o que mais prejudica é que certas revelações precisam ser narradas para que possamos entender a intenção ou a realidade dos personagens.
O trio principal consegue segurar bem suas atuações, seja Kirin Kiki (Tokue) com o elo de ternura, Kyara Uchida (Wakana) com a sutileza e moderação ou Masatoshi Nagase com a força.
Sabor da Vida é um desses filmes que traz mensagens diretas, sem muitos subterfúgios. Embora fale de tristezas, não fará você sofrer com os personagens ou chorar rios no cinema. E pode não ser o filme do ano, o filme da carreira da diretora, mas é agradável, traz certo bem estar. Apesar da vida, a gente pode ser feliz na busca por nossos próprios sabores.
FICHA TÉCNICA
Direção: Naomi Kawase
Roteiro: Naomi Kawase
Fotografia: Shigeki Akiyama
Montagem: Tina Baz
Música: David Hadjadj
Elenco: Kirin Kiki, Masatoshi Nagase, Kyara Uchida, Miyoko Asada, Etsuko Ichihara
Produtor: Masa Sawada, Koichiro Fukushima, Yoshito Oyama
Produção: Comme des Cinémas, Nagoya Broadcasting Network, Twenty Vision
Nacionalidade: França , Alemanha , Japão