CRÍTICA | ‘Black Mirror: Bandersnatch’ cumpre com louvor seu real objetivo: divertir

Bruno Giacobbo

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29 de dezembro de 2018

Em primeiro lugar, eu gostaria de deixar claro que foi um custo assistir ao novo longa-metragem da Netflix, Black Mirror: Bandersnatch. O motivo é o fato desta obra ser totalmente interativa e não poder ser vista em qualquer lugar. Inicialmente, tentei ver na televisão da sala, com o iPhone de controle remoto, mas o Chromecast não tinha a configuração adequada. Depois, pensei em ver no próprio telefone. Desisti, a tela era pequena. A próxima tentativa foi assistir pelo Blu-Ray. O resultado? Mais uma frustração: o aparelho também não estava configurado para este tipo de transmissão. O mesmo aconteceu com o videogame Wii, que há muito estava escondido em um armário qualquer. Foi um parto montá-lo, tirar o pó, achar pilhas novas e só aí descobrir que tampouco ele estava habilitado. Quando estava quase desistindo, corri para o quarto e aceitei que ver no computador (algo que não gosto muito) era a única solução possível. E querem saber? Valeu muito a pena.

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A história, que se passa na Grã-Bretanha, em 1984, é levemente inspirada em alguns elementos reais. Bandersnatch, um criatura inventada pelo escritor Lewis Carroll, em 1872, quase batizou um jogo que estava sendo desenvolvido pela Image Software, para o console Commodore 64, em meados da década de 80. Só que a empresa de Liverpool faliu antes que ele estivesse pronto. No filme, Bandersnatch é um livro interativo escrito pelo genial (e louco) Jerome F. Davis. Nele, os leitores têm a chance de determinar os rumos da aventura fazendo escolhas em nome do protagonista. Um destes leitores é Stefan Butler (Fion Whitehead), um jovem de 19 anos que mora com o pai, Peter (Craig Parkinson). Seu envolvimento com o livro começou após encontrar um exemplar deste nas coisas da mãe e, agora, ele deseja transformá-lo em um jogo. A chance de realizar este sonho vem com uma proposta para trabalhar na Tuckersoft, perto do seu grande ídolo, Colin Ritman (Will Poulter).

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Assim como no romance fictício, a partir deste instante, os espectadores têm a oportunidade de decidir os rumos desta história tomando decisões em nome de Stefan. Para não dizer que ainda não tínhamos sido convidados a brincar, pequenas escolhas como, por exemplo, que cereal o personagem deveria comer no café da manhã, já tinham ficado a cargo do público. Escolhas bem bobas, mas que nos deixam no clima do que está por vir. Quando comecei a ver o filme, achava que uma vez escolhido um caminho iriamos nele até o final e que para saber o que teria ocorrido de diferente, caso a escolha fosse outra, teríamos que recomeçar tudo de novo. Estava errado e esta é uma das melhores coisas desta produção. Em muitos momentos, ela te dá uma chance de retroceder e tomar outra decisão. Desta forma, praticamente não há tempo de alguém se arrepender. Logo, sigam o fluxo, deixem-se levar pelos acontecimentos como em qualquer outro longa. O único risco é passar horas olhando para uma tela.

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Engana-se quem pensa que a interatividade do filme tem a ver apenas com o livro Bandersnatch. Como uma obra de ficção científica, ainda que superficialmente, algumas teorias são discutidas. Existe livre arbítrio ou, apesar de todas as decisões que tomamos, nosso destino já está traçado? Existe apenas uma realidade ou existem outras realidades paralelas onde as nossas outras versões tomam decisões diferentes? Em qualquer uma destas teorias, a história parte da ideia que o ser humano tem pouca ou nenhuma liberdade para agir. Somos joguetes nas mãos de algo maior, assim como Stefan é na nossa. Para os que curtem referências, olho vivo, pois elas vão desde o Commodore 64, para o qual o jogo da vida real estava sendo produzido, até Philip K. Dick, um dos maiores autores do gênero, passando por menções a episódios do próprio Black Mirror. E por falar em autor, quem paira sobre a trama como uma referência vital (Pac-Man que o diga) é George Orwell: qual é o seu livro mais famoso?

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Quantos finais o longa tem? Depois de pouco mais de três horas assistindo (ou seria brincando?), eu cheguei a três desfechos em que os créditos começam a subir. Em alguns lugares, vi pessoas dizendo que seriam cinco finais possíveis. Talvez elas estejam considerando duas possibilidades, com as quais, diga-se de passagem, me deparei, que colocam a trama em uma sinuca de bico. Só que, nestes dois momentos, as letrinhas não apareceram, o menu interativo me forçou a retroceder e fui obrigado a escolher caminhos diferentes. E aí, claro, se repetisse as opções iniciais, ficaria em um eterno looping, indo e voltando para o mesmo lugar. Dito isto, boa parte da graça deste novo filme da Netflix está em explorar ao máximo todas as alternativas. Não comecem a assisti-lo se não dispuserem de todo o tempo do mundo. Não parem para dar um pulinho na rua com o intuito de comprar um saco de batatas ou farinha para o bolo da vovó. Estas pausas, certamente, estragarão a experiência.

O jogo desenvolvido por Stefan.

Ao término do filme, como crítico, me vi forçado a fazer a seguinte pergunta: “É possível avalia-lo como avaliaríamos qualquer outro trabalho?” E a resposta foi um sonoro não. E querem saber o porquê? Pois bem, entre outras coisas, como julgar um roteiro que tem, no mínimo, três finais e percorre trajetórias distintas até cada um deles? Como avaliar a montagem? A edição é aquele detalhezinho que confere alma ao produto final. E na película roteirizada por Charlie Brooker e dirigida por David Slade esta possui algumas particularidades que, em outras produções, seriam consideradas defeitos, mas que aqui podem ser tidas como meros desdobramentos de alguma realidade paralela. Black Mirror: Bandersnatch não foi feito com o objetivo de ser submetido aos humores da crítica especializada e disputar prêmios. Longe disto, seu real objetivo é divertir horrores, por sinal, algo que faz com muita competência.

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::: TRAILER

https://www.youtube.com/watch?v=rnrCdi53G7A

::: FICHA TÉCNICA

Título original: Black Mirror: Bandersnatch
Direção: David Slade
Elenco: Fionn Whitehead, Will Poulter, Craig Pakinson
Distribuição: Netflix
Data de estreia: sex, 28/12/18
País: Estados Unidos
Gênero: Ficção Científica
Ano de produção: 2018

Bruno Giacobbo

Um dos últimos românticos, vivo à procura de um lugar chamado Notting Hill, mas começo a desconfiar que ele só existe mesmo nos filmes e na imaginação dos grandes roteiristas. Acredito que o cinema brasileiro é o melhor do mundo e defendo que a Boca do Lixo foi a nossa Nova Hollywood. Apesar das agruras da vida, sou feliz como um italiano quando sabe que terá amor e vinho.
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