Crítica de Filme | Nosferatu – O Vampiro da Noite
Barbara Braga
No início de Nosferatu – O Vampiro da Noite, vemos uma série de imagens de múmias acompanhadas por uma música lúgubre, deixando claro um clima de vazio e angústia que nos acompanha até o fim. O filme é concebido não como um remake mas sim uma homenagem de Herzog ao clássico Nosferatu de F.W. Murnau e ao expressionismo Alemão, fazendo uma ligação com o Novo Cinema. E o selo Clássica nos presenteia com esse lançamento em versão remasterizada em digital e como era de se esperar, com uma ótima qualidade de som e imagem, dando a oportunidade aos que não puderam, de assistir em tela grande e aos que puderam, a chance de repetir a experiência.
A história se passa na cidade de Wismar, onde o corretor imobiliário Jonathan Harker (Bruno Ganz) recebe de Renfield (Roland Topor) a tarefa de ir a Transilvânia fechar a venda de uma propriedade para o conde Drácula. Sob os protestos de sua esposa Lucy que pressente que essa viagem não será de bom agouro, ele parte. Ao parar em uma estalagem de ciganos e contar seu destino ele é mais uma vez desencorajado a seguir viagem. Firme em seu propósito e apesar de todas as dificuldades ele finalmente chega ao castelo em ruínas do Conde. Após uma série de eventos infelizes Jonathan finalmente percebe que o conde é um vampiro e que este o deixou trancado no castelo e partiu para sua cidade atrás de Lucy, por quem se tornou obcecado. Jonathan inicia então sua jornada de volta para tentar salvar sua amada e sua cidade das influências maléficas de Drácula.
O roteiro foi baseado no filme Nosferatu e no romance Drácula, de Bram Stoker e Herzog não se preocupou tanto em contar a história dos personagens que já são tão conhecidos do público, e sim em desenvolver um filme especialmente visual e centrado nos dramas pessoais de cada personagem.
A história é contada através do olhar de Lucy e evidencia sua carência em relação ao marido. Lucy é romântica e sonhadora e deseja mais tempo e contato físico com Jonathan, as primeiras cenas já mostram que o casal dorme em camas separadas e poucos são os momentos de afeto entre os dois, e Jonathan apesar do amor que diz sentir por sua esposa, demonstra um certo tédio em relação a sua vida previsível e seu casamento morno e isso fica evidente na cena em que o casal toma café da manhã e quando Jonathan parte para o castelo mais com empolgação do que com tristeza apesar dos pedidos de Lucy. Jonathan busca uma aventura, algo novo em sua vida, ele quer fugir da monotonia mas se depara com um mal maior e volta decepcionado, fraco, doente e recusando os cuidados e carinhos de Lucy. O retorno de Jonathan mostra a fragilidade da condição humana e parece uma metáfora da condição da própria população alemã na época do pós guerra. Lucy passa então de dama em perigo a salvadora. Ela acredita que seu amor salvará Jonathan, e esse amor atrai ainda mais o conde e de certa forma ela também é atraída por ele, dado o antagonismo de seus personagens, enquanto ela tem um coração puro e um imenso amor por Jonathan, o conde está condenado a maldição da imortalidade e solidão, incapaz de sentir amor ou ser amado, uma criatura decrépita e abjeta, e essas nuances são mostradas de forma absolutamente espetacular por Kinski, com todas as suas expressões e com jogos de luz e sombra levando o espectador a sentir o peso dessa maldição. Drácula quer ser amado e Lucy quer amar e isso cria uma certa tensão sexual entre eles, entre o bem e o mal, mas apesar de todas as ofertas do vampiro ela se mantém fiel e decidida a salvar seu marido através do amor. Ela é a única que tem contato com o Conde e acredita que ele seja a origem do mal que afeta seu marido e a cidade, que entra em um delírio coletivo assolada pela peste. Ela é o sonho e a fé e com isso procura a ajuda do Dr Van Helsing (Walter Landengast) que aqui é um médico que não acredita em nada que não seja provado pela ciência, desencorajando e deixando Lucy sozinha com suas teorias supersticiosas. Sozinha, Lucy usará todos os meios possíveis para salvar seu marido e sua cidade do terrível vampiro.
Com destaque para as cenas de Lucy sentada na praia à espera do amado, a chegada do navio fantasma que traz com ele todo o mal, o primeiro contato entre Lucy e o Conde Drácula e para a bizarra cena do banquete com os ratos na cidade já tomada pela peste, Nosferatu, o Vampiro da Noite é uma poesia visual. Sua fotografia é uma das mais belas já vistas e usando cores claras para as cenas mais românticas e delicadas do casal, e cores escuras e com muitas sombras apara as cenas mais densas, consegue nos transportar para esse universo onírico e desolador, tudo isso acompanhado de uma trilha sonora misteriosa e impactante que vai aumentando a tensão de cada cena. A icônica interpretação de Klaus Kinski, a pálida e etérea figura de Isabelle Adjani, e o enfado e conformismo de Bruno Ganz enriquecem o filme com a intensidade dramática de cada personagem e fazem de Nosferatu, O Vampiro da Noite um filme autoral e obrigatório na lista dos amantes do cinema, para ver e rever.
FICHA TÉCNICA
1979, Alemanha/França, cor, 103 min., DCP
Elenco: Klaus Kinski, Isabelle Adjani, Bruno Ganz, Roland Topor, Walter Ladengast
Diretor de Fotografia: Jörg Schmidt-Reitwein
Montagem: Beate Mainka-Jellinghaus
Trilha Sonora: Popol Vuh
Produção, Roteiro e Direção: Werner Herzog
Título original: Nosferatu: Phantom der Nacht















































