Hollywood x Streaming: especialista analisa “guerra” no cinema

Cadu Costa

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8 de fevereiro de 2020

O Oscar 2020 é neste domingo (09) e, ao que tudo indica, as produções de streaming ganharam um destaque como nunca antes. No Globo de Ouro e Critics’ Choice Awards deste ano, as séries e filmes produzidos por empresas como a Netflix e Amazon mostraram ao público e aos críticos que vieram com força e pra ficar.

Os filmes O Irlandês (2019) e História de um Casamento (2019), da Netflix já venceram diversas premiações e agora chegam com moral no Oscar para concorrer à algumas das principais categorias, como Melhor Filme, Atriz, Ator, Atriz Coadjuvante e Ator Coadjuvante.

Com as nominações da edição deste ano, só a Netflix acumula 24 no total, incluindo também, Direção, Documentário, Roteiro Original, Roteiro Adaptado e muito mais.

Para falar um pouco sobre o poder dessas empresas nas grandes produções do cinema, entrevistamos Renan Lima da Broders, uma produtora de conteúdo audiovisual voltada ao digital.

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Sobre o especialista

Renan é coordenador de produção com foco em Marketing Digital e trabalha com grandes empresas como 99 Táxi, Nubank, Ambev, mas já empregou seu talento, além de Publicidade, com filmes e séries como Leve-me Pra Sair (2012), Odeio o Dia dos Namorados (2013), No Divã do Dr. Kurtzman (2013), bem como o curta premiado no Festival de Gramado,  (2015).

Veja como foi nosso bate-papo com direito, é claro, à palpites para o Oscar 2020.

Renan Lima, da Broders / Foto: Acervo pessoal

BLAHZINGA: Com tantas indicações no Oscar deste ano, vemos as produções de streaming alcançando posições inimagináveis há um certo tempo. Como você enxerga esse mercado ter chegado nesse nível?

RENAN LIMA: Eu acho que chegou e não vai embora. Chegaram pra ficar. A Netflix, por exemplo, com seu lançamento, abriu portas para outros serviços de streaming virem na cola. E a indústria de cinema, seja Hollywood ou Europa, terá de aceitar porque, no momento, eu vejo mercado pra todo mundo.

Você ainda tem os filmes arrasa-quarteirões que levam multidões aos cinemas e têm o mercado doméstico onde as pessoas gostam de assistir grandes produções em casa. A Netflix, como a pioneira, veio investir pesado. Antes ela fazia filmes menores pra vermos a repercussão do público e crítica, até que aos pouquinhos foram fazendo convites para pessoas mais renomadas no meio.

No ano passado mesmo, ela já bateu na trave com “Roma” (2018), de Alfonso Cuarón, onde chegou muito forte e só não levou o Oscar de Melhor Filme – levou o de Melhor Filme Estrangeiro – porque era um longa falado em língua não-inglesa. E, por conta disso, a Netflix deve ter pensado o porquê de não ter levado Roma e resolveu investir num diretor e elenco renomados, num filme grandioso falado em língua inglesa e está aí sua grande aposta: O Irlandês (2019).

A Netflix quer levar a premiação máxima do Oscar e eu acho que ela chega cada vez mais perto. Não sei se é ainda esse ano, mas eu acredito que há espaço para os grandes estúdios e os serviços de streaming, até porque, cada vez mais, grandes diretores, como Steven Spielberg, Spike Lee, estão abraçando o streaming. E ainda temos Amazon, além de Apple e Disney chegando. Então, a tendência é todos ‘criarem uma amizade’ ou o cerco vai se fechar.

BLAHZINGA: Então você diz que é bom todo mundo ficar amiguinho ou corre o risco de Netflix, Amazon Prime, Disney+ e cia. dominarem tudo?

RL: Eu acho que sim. Esse risco aumenta principalmente com a chegada da Disney+ e tudo que vem com ela, como a Marvel, o Universo Star Wars e a Fox. Ela já chegou forte com a série The Mandalorian e já está produzindo outra no Universo Star Wars, que é um sucesso há 42 anos e vai continuar sendo até quando não estivermos mais aqui.

Então acredito que lutar contra a Disney hoje e todo o seu poderio, seja no cinema, seja no entretenimento como um todo, é difícil. Tem que haver diálogo com os principais estúdios como a Paramount, Sony e etc. Não há mais volta.

A Amazon também chegou forte e não tem nada a perder porque é um site de compras online. Se não der certo, o streaming pra ela, volta para as suas origens e tudo certo. Por isso, eu acho que cada um vai pensar de um jeito, mas vai ter de aprender a conviver.

As premiações, os festivais tradicionais da Europa também vão ter de mudar algumas regrinhas para poder absorver essas produções e seus realizadores. Então, não tem jeito: o streaming veio pra ficar.

BLAHZINGA: Se pensarmos bem, hoje tudo é em streaming. Consumimos música, filmes e até livros online. Será que quando o primeiro carinha foi lá e colocou uma música online, aquele MP3 maroto, imaginava que chegaríamos nesse nível?

RL: Eu, particularmente, não imaginava. O meu primeiro contato com streaming já foi com a Netflix. E é interessante porque ela funcionava como um serviço de locadora. Eu já acho incrível o crescimento dela justamente porque acreditava que o DVD já era uma coisa revolucionária. Mas a Netflix já prospectava isso, já pensava em mudar o meio de consumo das pessoas.

Tipo, ‘Você quer um filme, eu vou enviar pra você’. E, com o tempo, isso foi virando um site, um aplicativo e foram ampliando com conteúdos originais e tudo o mais. Mas não, sinceramente, quando eu lembro de ter deixado meu discman de lado e partido pro MP3 não imaginava que o consumo de tudo hoje estaria em nuvens. Pelo menos não nessa velocidade.

BLAHZINGA: E já que chegaram tão rápido neste nível, o que podemos esperar mais do streaming? Dominação mundial?

RL: Pois é, eu estava pensando nisso um dia desses: “E se eu quiser esse filme original pra mim? E se algum dia não existir mais Netflix, Amazon, HBO, etc? E como adquirir aqueles filmes originais dessas plataformas que não existem à venda por aí? Como guardar isso pra mim?”.

Acho que é um pensamento válido esses serviços pensarem nisso. E em relação ao futuro, eu acredito que será as tradicionais marcas de cinema, como a Paramount, a Columbia, terem o seu próprio serviço de streaming. Ou, então, você entra no problema da TV a cabo onde assinamos um pacote com 200 canais e assistimos 15.  Ou seja, o consumidor vai precisar avaliar os serviços disponíveis pra escolher o que assinar e entender o que quer consumir.

Uma amiga montadora de cinema me mostrou uma matéria onde dizia que o cidadão médio americano assina dois serviços por mês, fica 30 dias, assiste todo o conteúdo dentro dele, cancela e repete tudo no mês seguinte. E isso é uma estratégia válida porque ter de pagar por todo conteúdo disponível em todas as plataformas fica inviável.

E as janelas serão importantes pra todo mundo. Quem gosta de filmes de super-heróis vai continuar vendo. Quem gosta de filmes conceituais, vai encontrar. Por outro lado, quem gosta de documentários, vai ver muitas coisas. Mas acho que todo mundo pensando junto, no novo, vai ter espaço para todos.

BLAHZINGA: E como você enxerga o streaming no Brasil? A TV aberta vai deixar de existir, pelo menos aqui?
RL: Eu acho que a TV aberta ainda vai existir por conta de vários fatores como anunciantes e o próprio público brasileiro mesmo que ainda gosta de consumir TV aberta. Mas vejo os principais canais do Brasil, como a Globo, mudando sua forma de produzir conteúdo. Eu vejo com bons olhos uma Globoplay, principalmente para mim como produtor, onde vejo mais uma janela se abrindo com novas narrativas, novos formatos. É muito bem-vindo.
BLAHZINGA: Por fim, como você enxerga o mercado de cultura no Brasil no momento de hoje?

RL: Eu acho que vamos viver um momento complexo em relação aos investimentos de cultura nas mais diversas áreas, sejam elas cinema, teatro, música. O que considero uma pena, porque, talvez, lá atrás, a gente já deveria ter conquistado uma pequena independência dos recursos públicos.

Infelizmente não aconteceu. Continuamos dependente desse sistema de financiamentos, não conseguimos fazer com esses filmes se paguem mesmo com alguns modelos bem-sucedidos. O que realmente fico triste porque tivemos um bom ano de 2019 com dois filmes brasileiros, Bacurau e A Vida Invisível sendo premiados no Festival de Cannes.

Mas o principal é que temos de trabalhar nossa formação de público, pois não adianta enchermos as salas de cinema daqui com seis filmes nacionais e acharmos que todos irão assistir. É um processo longo, temos de maturar e fazer com que as pessoas cheguem ao conteúdo. Por outro lado, esses últimos 20 anos foram muito ricos para o audiovisual brasileiro, com incentivos, com pessoas novas no mercado, filmes sendo exibidos fora do país.

Por isso, temos de pensar numa maneira de continuarmos produzindo a baixo custo, com novos meios de captação e segurar as pontas até esse momento passar. O cenário é difícil mas eu considero cultura uma necessidade básica e precisamos nos organizar pra não afastar o público e fazer ele entender o quanto isso é importante pra ele também.

PALPITES DE RENAN LIMA PARA O OSCAR 2020

  • Filme: 1917
  • Diretor: Sam Mendes
  • Ator: Joaquin Phoenix
  • Atriz: Renée Zellweger
  • Ator coadjuvante: Brad Pitt
  • Atriz coadjuvante: Laura Dern
  • Filme estrangeiro: Parasita

Cadu Costa

Cadu Costa era um camisa 10 campeão do Vasco da Gama nos anos 80 até ser picado por uma aranha radioativa e assumir o manto do Homem-Aranha. Pra manter sua identidade secreta, resolveu ser um astro do rock e rodar o mundo. Hoje prefere ser somente um jornalista bêbado amante de animais que ouve Paulinho da Viola e chora pelos amores vividos. Até porque está ficando velho e esse mundo nem merece mais ser salvo.
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